É assim que irá ser a minha intervenção inicial na 11.ª Comissão da Assembleia da República:
«O assunto que me trás
aqui hoje, em representação da “Comissão Nacional de Trabalhadores das
Assembleias Distritais”, resume-se numa simples frase:
Necessidade
de o legislador clarificar, sem margem para quaisquer dúvidas interpretativas,
quais foram as “intenções” ao aprovar a Lei n.º 36/2014, de 26 de junho.
E porquê?
Porque, ao contrário
daquelas que foram as palavras do senhor Secretário de Estado da Administração
Local e da senhora deputada Emília Santos (do PSD) aquando da apresentação da
proposta de lei n.º 212/XII ao Parlamento (e que se encontram exaradas no Diário da Assembleia da República, 1.ª
série, n.º 68, de 3 de abril de 2014) e que passo a citar:
Secretário de Estado da
Administração Local:
«… o que eu considero ser mesmo o caminho adequado é que as assembleias
distritais, com os meios de receitas normais que estão previstos na lei, possam
pagar entretanto os salários em atraso aos seus trabalhadores. Isso é possível
fazer, está previsto nas leis, mas se o Sr. Deputado o considera útil, julgo
que isso pode ser perfeitamente esclarecido nesta proposta de lei.» …
Deputada Emília Santos: «… Nesta circunstância,
comprometemo-nos desde já e sem desvirtuar a transparência democrática deste
diploma, a procurar, em sede de especialidade, introduzir alterações que visem
criar mecanismos de regularização das dívidas dos municípios, para que as
assembleias distritais procedam ao pagamento dos salários em atraso. Estamos
convictos que todos se irão empenhar na procura desta solução, que se espera
justa e amplamente participada.» …
Não só as autarquias
que antes se recusavam a pagar as contribuições a que estavam obrigadas
mantiveram a mesma posição, como a estas outras se juntaram alegando que desde 1
de julho de 2014 as Assembleias Distritais estão proibidas de arrecadar
receitas, efetuar despesas e manter trabalhadores, conforme assim o determina o
artigo 9.º do Anexo à Lei n.º 36/2014, justificam.
Ou seja, apesar de ter
sido introduzida à proposta do governo a norma provisória do artigo 9.º da Lei
n.º 36/2014, que diz expressamente, e passo a citar:
«Os
municípios que se encontram em incumprimento do dever de contribuir para os
encargos das assembleias distritais, incluindo os referentes a trabalhadores,
previsto no artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 5/91, de 8 de janeiro, devem
regularizar os respetivos pagamentos em atraso.»
O
problema dos salários em atraso nas Assembleias Distritais de Lisboa e de Vila
Real existente em abril de 2014 não só continuou por resolver até ao presente como
se agravou substancialmente após a publicação do novo regime jurídico ao
esbarrar com a postura intransigente, injusta e cruel, das autarquias
incumpridoras.
Mas, infelizmente, e
para total surpresa nossa, o próprio Tribunal Central Administrativo Sul
concluiu, no seu Acórdão de 15 de janeiro de 2015, ser essa a “intenção do
legislador”: impedir que a partir de 1 de julho as Assembleias Distritais liquidassem
quaisquer despesas incluindo, portanto, encargos com pessoal e custos de
funcionamento dos Serviços. Isto é, legitimou-se
aquela que, em nossa opinião, é uma medida claramente inconstitucional e uma
afronta ao Estado de Direito Democrático: que de 1 de julho até à integração na
nova Entidade Recetora os trabalhadores das Assembleias Distritais deviam ficar
privados do seu vencimento.
Terminado em dezembro
de 2014 o prazo de 120 dias para as Assembleias Distritais deliberarem sobre o
destino da sua Universalidade, e reportando-nos apenas àquelas que nessa data
ainda tinham pessoal a seu cargo (Beja, Lisboa, Porto, Santarém, Setúbal, Vila
Real e Viseu), certo é que apenas num caso (Setúbal) se operou a transferência
dos Serviços, pessoal e património para a nova Entidade Recetora continuando as
restantes, nesta data, a aguardar o desenrolar do processo de determinação
subsidiária previsto no artigo 5.º da Lei n.º 36/2014.
Situação que até à resolução
definitiva se pode prolongar ainda por largos meses protelando por tempo
indeterminado a agonia dos trabalhadores que, em Lisboa e Vila Real, se
encontram com salários em atraso há já muitos meses e, por isso, a urgência em clarificar, quanto antes, a Lei n.º 36/2014
cabendo à Assembleia da República o ónus de explicar qual é, afinal, o estatuto
destas entidades e dos seus trabalhadores neste “período de transição” e de,
tendo presente as intervenções atrás assinaladas, honrar a Palavra dita.
Além de que nada fazer
permitindo que essa inércia valide a interpretação das autarquias incumpridoras
e do Tribunal, é prejudicar deliberadamente os trabalhadores e uma forma de ser
conivente com uma injustiça que desrespeita a Constituição à qual todos os
presentes juraram obedecer.
Por
isso há que esclarecer:
Se
a verdadeira intenção dos partidos que aprovaram a legislação não terá sido
mesmo retirar a personalidade e capacidade judicial ativa às Assembleias
Distritais logo em 1 de julho de 2014 para que, a partir dessa data, estas deixassem
de poder reclamar quaisquer direitos em Tribunal como aconteceu com a
Assembleia Distrital de Lisboa que, apenas por esse facto, viu recusada a
impugnação do Despacho que o Governo publicou a 26 de novembro de 2014, quatro
meses depois do prazo estabelecido no n.º 2 do artigo 8.º da Lei n.º 36/2014.
Assumindo esses
partidos que, então, o objectivo da redação dúbia do diploma era poder vir a
dar cobertura, se necessário, a este tipo de atos (evitando que fossem atempadamente
contestados pelas Assembleias Distritais), pouco se importando, afinal, com a
situação dos seus trabalhadores.
Uma última pergunta:
Que
país é este e que Democracia é a nossa, onde mais depressa se protegem os
animais e perdoam os corruptos arrependidos do que se reconhece o direito dos
trabalhadores das Assembleias Distritais a receberem o seu salário
atempadamente?»
Depois é responder às perguntas que me possam vir a ser feitas. Estou preparada explicar o que tem sido o nosso quotidiano e para exigir responsabilidades. Estarão as(os) senhoras(es) deputadas(os) disponíveis para ouvir mas, sobretudo, para respeitarem a Verdade e corrigirem os seus erros?
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