quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Hoje é dia de Assembleia da República. Valerá a pena?


É assim que irá ser a minha intervenção inicial na 11.ª Comissão da Assembleia da República:

«O assunto que me trás aqui hoje, em representação da “Comissão Nacional de Trabalhadores das Assembleias Distritais”, resume-se numa simples frase:
Necessidade de o legislador clarificar, sem margem para quaisquer dúvidas interpretativas, quais foram as “intenções” ao aprovar a Lei n.º 36/2014, de 26 de junho.
E porquê?
Porque, ao contrário daquelas que foram as palavras do senhor Secretário de Estado da Administração Local e da senhora deputada Emília Santos (do PSD) aquando da apresentação da proposta de lei n.º 212/XII ao Parlamento (e que se encontram exaradas no Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 68, de 3 de abril de 2014) e que passo a citar:
Secretário de Estado da Administração Local: «… o que eu considero ser mesmo o caminho adequado é que as assembleias distritais, com os meios de receitas normais que estão previstos na lei, possam pagar entretanto os salários em atraso aos seus trabalhadores. Isso é possível fazer, está previsto nas leis, mas se o Sr. Deputado o considera útil, julgo que isso pode ser perfeitamente esclarecido nesta proposta de lei.» …
Deputada Emília Santos: «… Nesta circunstância, comprometemo-nos desde já e sem desvirtuar a transparência democrática deste diploma, a procurar, em sede de especialidade, introduzir alterações que visem criar mecanismos de regularização das dívidas dos municípios, para que as assembleias distritais procedam ao pagamento dos salários em atraso. Estamos convictos que todos se irão empenhar na procura desta solução, que se espera justa e amplamente participada.» …
Não só as autarquias que antes se recusavam a pagar as contribuições a que estavam obrigadas mantiveram a mesma posição, como a estas outras se juntaram alegando que desde 1 de julho de 2014 as Assembleias Distritais estão proibidas de arrecadar receitas, efetuar despesas e manter trabalhadores, conforme assim o determina o artigo 9.º do Anexo à Lei n.º 36/2014, justificam.
Ou seja, apesar de ter sido introduzida à proposta do governo a norma provisória do artigo 9.º da Lei n.º 36/2014, que diz expressamente, e passo a citar:
«Os municípios que se encontram em incumprimento do dever de contribuir para os encargos das assembleias distritais, incluindo os referentes a trabalhadores, previsto no artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 5/91, de 8 de janeiro, devem regularizar os respetivos pagamentos em atraso.»
O problema dos salários em atraso nas Assembleias Distritais de Lisboa e de Vila Real existente em abril de 2014 não só continuou por resolver até ao presente como se agravou substancialmente após a publicação do novo regime jurídico ao esbarrar com a postura intransigente, injusta e cruel, das autarquias incumpridoras.
Mas, infelizmente, e para total surpresa nossa, o próprio Tribunal Central Administrativo Sul concluiu, no seu Acórdão de 15 de janeiro de 2015, ser essa a “intenção do legislador”: impedir que a partir de 1 de julho as Assembleias Distritais liquidassem quaisquer despesas incluindo, portanto, encargos com pessoal e custos de funcionamento dos Serviços. Isto é, legitimou-se aquela que, em nossa opinião, é uma medida claramente inconstitucional e uma afronta ao Estado de Direito Democrático: que de 1 de julho até à integração na nova Entidade Recetora os trabalhadores das Assembleias Distritais deviam ficar privados do seu vencimento.
Terminado em dezembro de 2014 o prazo de 120 dias para as Assembleias Distritais deliberarem sobre o destino da sua Universalidade, e reportando-nos apenas àquelas que nessa data ainda tinham pessoal a seu cargo (Beja, Lisboa, Porto, Santarém, Setúbal, Vila Real e Viseu), certo é que apenas num caso (Setúbal) se operou a transferência dos Serviços, pessoal e património para a nova Entidade Recetora continuando as restantes, nesta data, a aguardar o desenrolar do processo de determinação subsidiária previsto no artigo 5.º da Lei n.º 36/2014.
Situação que até à resolução definitiva se pode prolongar ainda por largos meses protelando por tempo indeterminado a agonia dos trabalhadores que, em Lisboa e Vila Real, se encontram com salários em atraso há já muitos meses e, por isso, a urgência em clarificar, quanto antes, a Lei n.º 36/2014 cabendo à Assembleia da República o ónus de explicar qual é, afinal, o estatuto destas entidades e dos seus trabalhadores neste “período de transição” e de, tendo presente as intervenções atrás assinaladas, honrar a Palavra dita.
Além de que nada fazer permitindo que essa inércia valide a interpretação das autarquias incumpridoras e do Tribunal, é prejudicar deliberadamente os trabalhadores e uma forma de ser conivente com uma injustiça que desrespeita a Constituição à qual todos os presentes juraram obedecer.
Por isso há que esclarecer:
Se a verdadeira intenção dos partidos que aprovaram a legislação não terá sido mesmo retirar a personalidade e capacidade judicial ativa às Assembleias Distritais logo em 1 de julho de 2014 para que, a partir dessa data, estas deixassem de poder reclamar quaisquer direitos em Tribunal como aconteceu com a Assembleia Distrital de Lisboa que, apenas por esse facto, viu recusada a impugnação do Despacho que o Governo publicou a 26 de novembro de 2014, quatro meses depois do prazo estabelecido no n.º 2 do artigo 8.º da Lei n.º 36/2014.
Assumindo esses partidos que, então, o objectivo da redação dúbia do diploma era poder vir a dar cobertura, se necessário, a este tipo de atos (evitando que fossem atempadamente contestados pelas Assembleias Distritais), pouco se importando, afinal, com a situação dos seus trabalhadores.
Uma última pergunta:

Que país é este e que Democracia é a nossa, onde mais depressa se protegem os animais e perdoam os corruptos arrependidos do que se reconhece o direito dos trabalhadores das Assembleias Distritais a receberem o seu salário atempadamente?»

Depois é responder às perguntas que me possam vir a ser feitas. Estou preparada explicar o que tem sido o nosso quotidiano e para exigir responsabilidades. Estarão as(os) senhoras(es) deputadas(os) disponíveis para ouvir mas, sobretudo, para respeitarem a Verdade e corrigirem os seus erros?

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