
Por isso, temos mais uma pergunta a fazer:
Porque infinita é a vontade de sonhar e chegar sempre mais além… Espaço de convívio e reflexão onde as palavras são sementes que crescem livres de amarras.
Sabia que, neste local era para ter sido construído o novo edifício dos Paços do Concelho?
E que o terreno foi vendido na condição de nele serem instalados equipamentos colectivos, mas a Câmara Municipal de Almada vendeu parte das parcelas a terceiros para fim diverso do acordado (galeria comercial e parque de estacionamento)?
Sabia que o anterior proprietário dos terrenos colocou a autarquia em Tribunal e de recurso em recurso chegaram ao Supremo Tribunal de Justiça que acabou considerando que a Câmara Municipal de Almada “violou o contrato que livremente subscreveu com a A., frustrando, dessa forma, a boa fé que a mesma usou para com ele na realização e na concretização do contrato que lhe serviu de suporte”?
E que o STJ considerou que se estava “no que se refere ao terreno destinado aos Paços do Concelho, perante uma violação culposa por parte do R. Município de Almada” e “culposa porque o R. Município podia e devia ter honrado a sua palavra e não o fez, alterando o fim estabelecido por contrato, o que merece a reprovação do direito”?
Sabia que o STJ concedeu ao antigo proprietário o “direito à resolução do contrato firmado com o R. Município de Almada” na parte relativa ao terreno destinado a Paços do Concelho e que poderia o mesmo, numa acção em separado pedir a devolução dos terrenos ou uma justa indemnização?
Não acredita? Então leia os excertos da sentença (já transitada em julgado) que a seguir se transcrevem:
«Por escritura de 04 de Maio de 1973, a A. declarou vender e o R. declarou comprar diversas parcelas, sendo uma destinada à construção do Cine-teatro, outra para construção de edifícios de habitação colectiva e comércio, e outra ainda destinada ao edifício dos Paços do Concelho. (…)
A parcela destinada aos Paços do Concelho passou a estar descrita sob o nº 24120, mas foi, posteriormente, anexada com uma outra, objecto da última escritura referida, passando a constituir um único prédio, ora descrito sob o nº 1096.
Este novo prédio - nº 1096 - foi objecto de uma transacção entre o R. Município de Almada e a interveniente Empresa-B relativamente ao direito de superfície no solo e no subsolo, e lá foi construído um parque de estacionamento e galerias comerciais.
O R., porém, não construiu nos terrenos referidos nas aludidas escrituras, nem o Cine-teatro nem os Paços Municipais, sendo certo que a cedência das parcelas de terreno foi motivada pela satisfação das condições previstas nos alvarás de loteamento, já que as licenças de construção para os terrenos loteados só seriam emitidas depois das escrituras de cedência dos respectivos alvarás.
A cedência dos terrenos referidos nas escrituras da A. para o R. foi motivada pela satisfação de condições previstas nos alvarás de loteamento em relação à 1ª e pela intenção de o 2º pretender dar a esses terrenos o destino previsto nas respectivas escrituras. (…)
Porém, a A. não teria alienado os ditos terrenos ao R. Município de Almada se soubesse que neles não seriam instalados equipamentos públicos. (…)
Nos terrenos foram implantados equipamentos públicos, nomeadamente o Fórum Municipal Romeu Correia, utilizado para fins culturais e recreativos e onde está instalada a biblioteca e um auditório, espaços de utilização colectiva.
Os Paços do Concelho não foram no entanto, construídos. (…)
Tanto A. como R. quiseram, de uma forma livre (não foi arguido nenhum vício de vontade, como já ficou referido) vincularem-se a respeito do destino a dar aos terrenos. (…)
Ou seja, a finalidade dos terrenos, expressamente assumida pelas duas partes, foi incluída nos negócios, passando a fazer parte dos seus conteúdos porque ambas as partes tinham nisso interesse. (…)
Ora, analisados os factos à luz das considerações expostas, não podemos deixar de manifestar a nossa concordância com a posição do ilustre Professor consultado: ao desviar os terrenos que estavam destinados aos Paços do Concelho, o R. violou o contrato que livremente subscreveu com a A., frustrando, dessa forma, a boa fé que a mesma usou para com ele na realização e na concretização do contrato que lhe serviu de suporte.
Não era indiferente para a A. o destino de tais terrenos e de tal forma o não era que ela não teria celebrado a respectiva escritura se soubesse que o destino dos mesmos não seria respeitado.
Mas, o R. não só não edificou os Paços do Concelho nos terrenos previamente a eles destinados, como acabou por celebrar, já em 17 de Dezembro de 1998, com a Empresa-B um contrato que permitiu a esta a construção de um parque de estacionamento e de galarias comerciais, em flagrante infracção ao contratualizado. (…)
Ao desviar os terrenos que tinham como destino os Paços do Concelho para outra coisa bem diferente, o R. Município de Almada violou a parte do contrato que mais espelhava a liberdade de contratar já que o fim foi por ele e pela A. livremente determinado. (…)
Mas, o incumprimento foi apenas parcial, pelo que, nos termos do art. 802º do C. Civil assista à A. o direito à resolução do contrato firmado em 04 de Maio de 1973, depois rectificada a 16 de Julho de 1976, na parte relativa aos terrenos destinados aos Paços do Concelho ou a exigir o cumprimento do que for possível, para além do direito à indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença. (…)
Estamos, no que se refere ao terreno destinado aos Paços do Concelho, perante uma violação culposa por parte do R. Município de Almada e o incumprimento em causa não pode, atentos os valores que estão em jogo (veja-se, desde logo, os montantes que foram negociados nos contratos com a Empresa-B e desta com a Empresa-D) ser considerados de "escassa importância".
Culposa porque, nos temos do nº 1 do art. 799º do C. Civil, a ele competia a prova de que a falta de cumprimento da obrigação não adveio de culpa sua, o que não foi feito.
E culposa porque o R. Município podia e devia ter honrado a sua palavra e não o fez, alterando o fim estabelecido por contrato, o que merece a reprovação do direito.
In casu, a A. pediu a resolução do contrato e a consequente entrega dos terrenos ou, se esta não for possível, o valor em dinheiro, a liquidar em execução de sentença.
Não restam dúvidas que lhe assiste o direito à resolução do contrato na medida que houve incumprimento parcial por parte do R. Município de Almada.
Ora, a resolução, na falta de disposição especial, é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade, ut art. 433º C. Civil.
Significa isto que a A. terá direito a reaver os terrenos que seriam destinados a Paços do Concelho contra a restituição do respectivo preço, em obediência ao disposto no nº 1 do art. 289º do C. Civil.
A entrega dos terrenos, enquanto consequência da resolução, está dependente da sorte do pedido reconvencional, razão pela qual só depois da apreciação de tal pedido se poderá dizer se a mesma poderá ocorrer. (…)
Decisão:
(…)
Em conformidade com o exposto e sem necessidade de qualquer outra consideração, decide-se, no parcial provimento da revista, conceder à A. o direito à resolução do contrato firmado com o R. Município de Almada e relativo ao terreno destinado a Paços do Concelho.
Após trânsito, ordena-se a remessa dos autos directamente ao tribunal de 1ª Instância com vista à decisão do pedido reconvencional.»
Supremo Tribunal de Justiça
Acórdão de 9 de Maio de 2006
(Processo n.º 37/06, Ref.ª n.º 2666/2006)
Colectânea de Jurisprudência, n.º 192, Tomo II/2006 (Abril/Julho)
Maria Emília Neto de Sousa
(Presidente da Câmara Municipal de Almada)
X
Catarina de Sousa Marques Freitas
(Administradora Delegada da AGENEAL – Agência Municipal de Energia de Almada)
Estranharão a que propósito vos trago, aqui, este assunto. Mas se lerem o texto que vem a seguir perceberão o alcance da pergunta que titula este artigo e que aparece na sequência das irregularidades detectadas ao nível dos recursos humanos na Câmara Municipal de Almada que tenho vindo a denunciar neste espaço.
Esta é mais uma! E bastante grave.
Não costumo identificar nomes e muito menos colocar as fotografias dos visados. Mas neste caso, o envolvimento directo destas duas pessoas consta de documentos oficiais divulgados online na página da Inspecção-Geral da Administração Local e, por isso, nomeá-las não é infringir a lei da protecção de dados pessoais (aí, teriam de acusar a IGAL primeiro). Assim como, colocar as suas fotografias, não é mais do que dar um rosto a nomes públicos, cuja imagem se encontra disponível na Internet, seja no portal do município de Almada, na página da AGENEAL ou até em notícias dispersas na comunicação social.
Comecemos, então, por contar, de forma sumária, a história de Catarina Freitas na Câmara Municipal de Almada (para pormenores mais detalhados, podem consultar o Relatório Parcelar n.º 1 da Inspecção Ordinária Sectorial ao Município de Almada):
Em 14-10-1999, Catarina Freitas (licenciada, sem vínculo à Administração Pública) é nomeada, em Comissão de Serviço, para exercer o cargo de Directora do Projecto Municipal de Ambiente, na sequência de recrutamento excepcional e urgente conveniência de serviço.
E, por deliberação do executivo de 10-11-1999, Catarina Freitas é nomeada para exercer o cargo de Administradora Delegada da AGENEAL – Agência Municipal de Energia de Almada, lugar onde se mantém até ao presente.
Entretanto, a Presidente da Câmara, por despacho de 27-02-2000, determinou fosse aberto concurso interno de ingresso para um lugar na categoria de técnico superior de 2.ª classe (engenharia química) do quadro de pessoal da autarquia, destinado a prover aquela dirigente no respectivo lugar.
Decorridos os trâmites do concurso, Catarina Freitas acabou por assinar contrato administrativo de provimento, em regime de estágio probatório, com duração de um ano, em 09-04-2001, mantendo, no entanto, as funções e o vencimento correspondentes ao lugar de Directora de Projecto Municipal de Ambiente e sem se desligar do cargo de Administradora Delegada da AGENEAL.
Apesar do estágio ter terminado a 08-04-2002, Catarina Freitas não prestou contas do seu trabalho durante mais de três anos.
Em 14-10-2002, Catarina de Freitas continuou a exercer funções como dirigente sem, contudo, lhe ter sido formalmente renovada a Comissão de Serviço (portanto, ao arrepio da lei).
O terceiro mandato de Catarina de Freitas como dirigente acontece, desta vez, por renovação expressa da Presidente da Câmara por seu despacho de 25-05-2005.
Contudo, na opinião dos inspectores e segundo a jurista da IGAL (cujo parecer pode consultar AQUI), aquele despacho encontra-se ferido de nulidade “por impossibilidade de objecto (artigo 133.º, n.º 2, alínea c) do CPA).” (lembro que o segundo mandato fora exercido sem que o primeiro tivesse sido renovado).
Além disso, a “nomeação em cargo dirigente que aquele despacho consubstancia deveria, obrigatoriamente, ser precedida de novo procedimento concursal”, o que não se verificou. Ou seja, Catarina de Freitas continuou a exercer funções como dirigente apesar de a sua nomeação carecer, em absoluto, de forma legal.
Finalmente, com cerca de 41 meses de atraso (41 meses, não 41 dias), em 06-10-2005, Catarina Freitas apresenta o relatório do estágio referente ao período de 09-04-2001 a 09-04-2002, o qual foi classificado e homologado pela Presidente da Câmara que lhe atribuiu a classificação de 16 valores.
Insatisfeita com a nota obtida, Catarina Freitas, alegando que durante aquele tempo exercera funções como Administradora Delegada da AGENEAL, reclama e, em sede de revisão, é-lhe atribuída a classificação final de 20 valores.
E, finalmente, em 28-02-2007, na sequência da suposta conclusão do respectivo estágio probatório (de há, aproximadamente, cinco anos atrás e cerca de 16 meses após a entrega do respectivo relatório), mantendo em simultâneo o cargo de Directora do Projecto Municipal de Ambiente e o lugar de Administradora Delegada da AGENEAL – Agência Municipal de Energia de Almada, Catarina Freitas é nomeada definitivamente na categoria de Técnica Superior de 2.ª Classe, por despacho da Presidente da Câmara, que determina que a produção de efeitos seja contada desde 31 de Julho de 2002 (facto não referido pela Inspecção mas que consta do Aviso publicado no DR, II série, n.º 78, de 20 de Abril de 2007).
Ou seja, Catarina Freitas termina o estágio mais de quatro anos após a data oficial da sua conclusão, ocorrida a 09-04-2002, e vem a ser nomeada com a data efeito de 31-07-2002, ficando no vazio o período que medeia entre Abril e Julho de 2002.
Confusos? Pois… se até os inspectores o ficaram. Qual é, afinal, a situação jurídica e funcional de Catarina Freitas?
A gravidade das situações detectadas (e não apenas o caso em apreço, ao todo houve mais de uma dezena sendo que este é, de facto, o mais gritante) foi de tal ordem que o Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local homologou o Parecer Final da inspecção por seu Despacho de 24-07-2007, ordenando:
“Que se participe ao Ministério Público no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada a matéria constante dos pontos 1, 2 e 24 do ponto 1.3.1 do Capítulo II do relatório [referente ao processo de Catarina Freitas], a fim de ser proposta a respectiva acção judicial.”
Em virtude de se ter concluído:
Que «os agentes que autorizaram os pagamentos correspondentes ao desempenho do cargo dirigente incorrem em responsabilidade financeira reintegratória por se terem verificado pagamentos ilegais que causaram dano para o erário público.»
Que «Catarina Freitas está obrigada a repor as quantias recebidas indevidamente, a título de remunerações e demais abonos inerentes ao exercício do cargo dirigente solidariamente com a Edil Presidente da Câmara Municipal de Almada, Maria Emília Neto de Sousa” entre outros, como sejam os então Directores Municipais de Recursos Humanos e de Administração e Finanças.
Esta é, de facto, uma longa história. Mas que precisava de ser contada.
Desconhece-se, nesta data, decorridos cerca de três anos sobre o Despacho do SEAAL, que desenvolvimentos tiveram os respectivos processos, nomeadamente os do foro judicial.
Apenas se sabe que Catarina Freitas continua a desempenhar as mesmas funções de sempre: é Técnica Superior da CMA, desempenha o cargo de Directora do Projecto Municipal de Ambiente e é Administradora Delegada da AGENEAL, embora facilmente se presuma, face às irregularidades atrás detectadas, que a renovação da Comissão de Serviço como dirigente e que deveria ter ocorrido em 2008 (dando início ao quinto mandato) enferma dos mesmos vícios.
Fossem estas ilegalidades cometidas numa autarquia do PS, PSD, CDS, BE ou independentes e já a CDU teria feito um escândalo denunciando a situação. Em Almada, mantêm-se calados. Por que será?
Como é possível que os dirigentes da área dos Recursos Humanos e do sector Financeiro dêem cobertura a actos desta natureza? Que princípios éticos defendem? Que profissionalismo é o seu?
Estamos a falar de muitos, muitos mesmo, milhares de euros pagos indevidamente e, até à data, ninguém foi responsabilizado. Uma vergonha!
Um tratamento de favorecimento como o descrito e com os privilégios que têm vindo a ser concedidos à pessoa em causa, é caso para perguntar:
Que estranha relação é esta que existe
entre a Presidente da CMA e Catarina Freitas?
Política? Familiar? Ambas?
E pasme-se: apesar da sentença ter mais de um ano, acabei agora mesmo de saber que a CMA (a tal que tem uma situação financeira excelente), ainda não liquidou o dinheiro que foi condenada a pagar ao trabalhador. Um comportamento digno de louvor, não acham?
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Nota:
Já depois da publicação deste artigo, fui informada de que a CMA recorrera para o Supremo Tribunal de Justiça que, no entanto, veio a confirmar a sentença da 1.ª instância, por Acórdão de 03-02-2010. Como a autarquia, mesmo assim, ocorrido o trânsito em julgado, se recusa a pagar as suas obrigações, o trabalhador teve de interpor uma acção executiva para fazer valer os seus direitos. Brevemente voltarei a este assunto para esclarecimentos adicionais. Cacilhas, 13-08-2010.