Reunião da Assembleia Distrital de Lisboa de dia 4 de junho de 2014
«O vasto património predial da
Assembleia Distrital de Lisboa, uma herança das entidades suas antecessoras (a
Junta Geral do Distrito de Lisboa até 1936, a Junta de Província da Estremadura
até 1959 e a Junta Distrital de Lisboa até 1974) encontra-se distribuído por
quatro concelhos: Amadora, Lisboa, Odivelas e Loures.
Composto por várias quintas seculares (algumas construídas no século XVII e XVIII), mais de duas centenas de hetares de terrenos rústicos, bairros sociais (com centenas de frações habitacionais, estabelecimentos comerciais e de serviços) e uma escola agrícola na periferia da capital e edifícios públicos (com oito andares, três níveis de caves e estacionamento privativo) no centro de Lisboa, este vastíssimo conjunto de bens prediais, avaliado em muitos milhões de euros, cedo despertou a cobiça daquele que viria a ser o último presidente da Assembleia Distrital de Lisboa antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 5/91, de 8 de janeiro.
A maioria das propriedades rústicas localizam-se na Pontinha (hoje Odivelas, à época concelho de Loures) e embora estejam em áreas geologicamente instáveis e leitos de cheia, ou sejam terras de elevada aptidão agrícola (muitas parcelas integram a RAN e até a REN), isso não impediu o Vice-governador Civil, António do Nascimento Machado Lourenço, à revelia do órgão deliberativo distrital e sem o necessário alvará da câmara municipal, de as retalhar em centenas de lotes para construção (urbana e industrial), com registo efetuado na Conservatória Predial de Odivelas e alteração do respetivo cadastro nas Finanças, tornando-as extremamente apetecíveis à especulação imobiliária.
E conhecido o traçado da CRIL, a sobrevalorização fundiária atrás referida apresentava-se ainda com uma forte probabilidade de se tornar numa excelente fonte de rendimento a quando das expropriações por utilidade pública para construção do IC16 e do IC17, permitindo assim o financiamento de um certo “projeto de desenvolvimento integrado” (que previa a construção de centenas de fogos, equipamentos sociais e até a instalação de um parque industrial) nesta espécie de “loteamento clandestino”, delineado pelo Vice-governador Civil mas que nunca chegou a ser formal e legalmente aprovado pela Assembleia Distrital de Lisboa, proprietária dos terrenos.
Contudo, as conversações parlamentares tendentes à concretização da revisão da Constituição que aconteceria em 1989 (iniciadas com bastante antecedência), ao propor retirar os Governadores Civis da presidência das Assembleias Distritais, vieram ameaçar o futuro auspicioso que, ao que tudo indica, António do Nascimento Machado Lourenço previra para si próprio como “gestor imobiliário” dos bens prediais da Assembleia Distrital de Lisboa e, como tal, houve que preparar uma estratégia que permitisse assegurar-lhe esse objetivo (como os factos apresentados parecem indicar).
Um caminho que começou a ser paulatinamente preparado pouco depois da tomada de posse como Presidente da ADL, com o incumprimento dos prazos para a Assembleia Distrital de Lisboa se pronunciar nos termos da Lei n.º 14/86, de 30 de maio, passou pelas falsas garantias dadas aos autarcas sobre o destino e propriedade do património nas reuniões realizadas em 1987 e 1988, assentou no não funcionamento do órgão deliberativo distrital durante três anos consecutivos (entre 18-03-1988 e 08-04-1991) e culminou com uma “curiosa” interpretação retroativa do Decreto-Lei n.º 5/91, de 8 de janeiro, e a criação de uma alegada “Comissão de Gestão do Património dos ex-Serviços da ADL” (em 09-03-1991) que confiscou todos os bens atrás referidos, desfalcou contas bancárias, apropriou-se de mais de uma dezena de veículos automóveis e ocupou até a sede da entidade (incluindo o Salão Nobre onde se realizavam as sessões plenárias e o gabinete da presidência).
Como foi tudo isto possível?
Com a conivência de Afonso de
Moura Guedes (Governador Civil de Lisboa), o apoio incondicional de José Manuel
Nunes Liberato (Secretário de Estado da Administração Local), o aval de Manuel
Dias Loureiro (Ministro da Administração Interna) e a “bênção final” de Aníbal
Cavaco Silva (Primeiro Ministro).
Fundamental à consecução prática
das muitas ilegalidades praticadas por Machado Lourenço durante o seu longo
“reinado” como Vice-governador Civil (de 1985 a 1995) foi a conveniente
subserviência de uma corte de funcionários que tendo sido por si beneficiados
ao longo dos últimos anos com promoções ilegais (como a IGAT veio a comprovar
em 1992) se terá sentido na obrigação de “fechar os olhos” aos atos
criminalmente censuráveis do Presidente da ADL e depois Presidente da Comissão
de Gestão dos ex-Serviços, alguns mesmo com participação ativa na sua
concretização.
Estão neste caso, em particular,
a responsável pelos Serviços Administrativos a quem cabia, também, exercer
funções como Notário Privativo da Assembleia Distrital (Maria dos Anjos Santos)
e o “assessor de gabinete” Manuel Mendes Conceição (aposentado, em regime de
profissão liberal, embora sem contrato de prestação de serviços legalmente
outorgado, como a IGAT veio a apurar), pessoa da confiança política e pessoal
do então Presidente da ADL e o seu “braço direito”, mais tarde nomeado vogal da
Comissão de Gestão dos ex-Serviços.
Aproveitamos a oportunidade para
apresentar, também, informação sobre a Assembleia Distrital do Porto e de como
o processo de transferência de património foi tratado pelo Governador Civil
para que se perceba, por comparação, que o problema em Lisboa transcendeu
quaisquer orientações políticas e se tratou, apenas, da satisfação de
interesses pessoais do Vice-governador Civil, António do Nascimento Machado
Lourenço, que lamentavelmente (e por razões que desconhecemos) obtiveram a
cobertura do Secretário de Estado da Administração Local, José Manuel Nunes
Liberato, e do Ministro da Administração Interna, Manuel Dias Loureiro.»
Fonte: Relatório e Contas de 2013, pág. 115-117.
Fonte: Relatório e Contas de 2013, pág. 115-117.
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