Sonhos Inacabados, de Manuel dos Anjos Delgado [livro que ontem tive a honra de apresentar numa sessão em que foi anfitrião o presidente da Junta de Freguesia da Cova da Piedade], é uma viagem em
forma de livro de sonetos.
Retrata-nos uma vida simples, de
quem veio do campo, nascido numa família humilde, passou uma infância com
dificuldades mas acabou sempre por conseguir vencer, com persistência, os
obstáculos que foi encontrando no caminho.
Assim é a imagem do pastorinho
que
"andando à chuva e ao frio
com o rebanho a pastar
com todo o seu brio
passava o tempo a cantar."
Dos muitos sonhos vividos aos que
ficaram por concluir, estes poemas são, sobretudo, o retrato de um homem
sensível, que consegue transformar a simplicidade dos seus sentimentos em
descrições poéticas despretensiosas, com uma linguagem simples mas eficaz na
mensagem que nos pretende transmitir.
Apesar de nos confessar que
"eu não nasci poeta
e nunca tive um canudo
não atingi essa meta
mas fiz um pouco de tudo",
Manuel Delgado mostra ter um
talento especial para conjugar as sílabas e encontrar as palavras adequadas à
expressão daquilo que sente, como se a ponta da caneta fosse a sua varinha de
condão.
Por isso, é o próprio que nos
conta:
"quando poesia é tema
eu nunca me comprometo
pode sair um poema
como sair um soneto."
Sentimentos como o amor:
"por amor tudo se faz…
mas quando é maltratado
ele fica revoltado
e depressa se desfaz",
"a angústia:
ao vermos alguém sofrer
que no seu leito deitado
nós sofremos a seu lado
e nada poder fazer"
ou a saudade:
"porque sempre te amei
eu não te esqueci
e nunca te esquecerei
com a saudade viverei",
encontra-mo-los ao virar de cada
página, escondidos nas entrelinhas de cada verso.
Manuel Delgado é demasiado
modesto para admitir que a sua escrita não sendo erudita tem, no entanto, a
magia das coisas simples que nos cativam pela empatia que se sente ao ler cada
verso, conseguindo a proeza de nos transportar para as paisagens que descreve
quando fala dos animais ou das plantas do campo, até das estrelas no horizonte
ou da brisa do amanhecer.
Ler este livro é ter a
oportunidade de, através da sua leitura, encontrar um oásis de paz mesmo que,
de quando em vez, a tristeza e a desilusão apareçam como naquele soneto que
fala do futuro
"quando ainda criança
pensava num futuro risonho
fui perdendo a esperança
de concretizar tal sonho",
ou naqueloutro que nos em que
Manuel Delgado nos diz:
"a vida nos dá lições
a vida é uma mentira
vivemos em ilusões
que ela depois nos tira."
Mas logo a felicidade aparece e
faz esquecer momentos menos bons, como podemos deduzir pela descrição:
"quando íamos ao baile
dançávamos até ser dia
cobrias-te com o teu xaile
radiante de alegria."
Em suma, um livro de poesia que nos
ajuda a descontrair e que vale a pena ler.
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