Há algum tempo atrás, num post aqui publicado, citava Tony Judt. Um leitor anónimo, se não me falha a memória, surgiu com uma crítica: eu não referia a fonte com precisão.
Confesso que não tencionava voltar ao caso, porque, na verdade, escrever em blogs não tem a exigência de um trabalho académico. Tencionava pura e simplesmente deixar cair a crítica, porque a julgara impertinente. Todavia, com o andar do tempo, resolvi voltar, agora com algum detalhe.
Assim:
1. Quem é Tony Judt? É um dos historiadores que melhor escreveu sobre o século XX. Morreu há pouco mais de um ano, tendo-nos deixado um fascinante testamento político – “Um tratado sobre os nossos descontentamentos”, na tradução portuguesa –, onde não se encontram receitas para o socialismo democrático, sim uma chamada de atenção para a necessidade urgente de se encontrarem soluções à altura do legado da socialdemocracia, valorizando-se o papel do Estado, uma narrativa moral, uma linguagem de fins e meios, a luta contra as desigualdades. Daqui decorre a necessidade de aberto debato, de ideias novas, de espírito crítico, etc, a fim de não se repetirem os mesmos erros do passado.
Os jovens são os seus principais destinatários, visto que são vítimas, hoje, de grandes frustrações nas suas vidas.
E agora vou à tal história da falta de rigor.
Quando citei Tony Judt tinha apenas iniciado a leitura desse importante ensaio, escrito graças à colaboração de ex-alunos que organizaram informação dispersa por vários escritos, tendo o autor recebido muitas sugestões e críticas a textos elaborados ao longo de anos e tendo, também, como tantas vezes acontece em situações semelhantes, tido o suporte da sua família para tal empreendimento.
No entanto, e apesar de se tratar de um ensaio, aí vai agora uma crítica também: todas as epígrafes não expressam os três dados importantes – autor, obra, data – o que não implicou que o autor não desse o aval à referida publicação.
Ainda bem, digo eu, porque se Tony Judt o não tivesse feito, não teríamos o prazer
de ler uma obra tão importante. "Está aqui tudo"…
2. Disse atrás: “Está aqui tudo”. É verdade. Porém, a partir do capítulo IV até ao fim, surgem, parece-me, algumas afirmações que merecerão alguma reserva ou pelo menos alguma discussão.
Vejamos algumas:
1ª – (página 141). “O capitalismo não é um sistema político”, exemplificando que tanto pode aparecer em ditaduras de direita (Chile de Pinochet) como em ditaduras de esquerda (China contemporânea), monarquias sociais-democratas (Suécia)ou repúblicas plutocráticas (USA). Efectivamente pode não ser “um sistema político”, mas tem características comuns que afectam o processo do quotidiano da vida individual, familiar e colectiva, na medida em que “inferioriza”o factor trabalho, e não promove o “bem comum”.
2ª – (página 177). “Em sociedades pós-religiosas como a nossa, onde a maioria encontra sentido e satisfação em objectivos seculares, só atendendo o que Adam Smith chamou os nossos “instintos benévolos” e contrariando os nossos desejos egoístas é que podemos…”produzir entre a humanidade aquela harmonia de sentimentos e paixões que compõe toda a sua nobreza e decência”. Certo, contudo não basta apenas a existência dos bons sentimentos…
3ª – (página 185). Ao falar da globalização, fala-nos dos democratas-cristãos de Ângela Merkel que abdicaram “do seu breve entusiasmo pelo mercado em favor de uma identificação popular com o Estado de mercado social como garantia contra os excessos da finança globalizada”.Hoje, isto não nos parece assim.
Espero com estas notas ter contribuído para o despertar dos leitores que não tenham lido esta obra “tão pouco rigorosa”… o venham a fazer. Como espero também que os leitores me desculpem o humor. E me desculpem ainda se acaso tive alguma falha na sintaxe, fruto de tão à pressa ter escrito estas notas.
Não resisto só mais a uma notinha sobre “as tais fontes”.
Em 1983-84 e em 1987-88, o Professor Vitorino Magalhães Godinho orientou dois seminários livres na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UNL, respectivamente subordinados ao tema “Análise e Teoria das Fontes” e “Portugal: Problemas e Ideias”, frequentados por assistentes, doutorados, professores até do ensino secundário que vinham de fora de Lisboa. Gente que gostava de aprender. Citando um já à época brilhante doutorado em literatura, entre o grupo dos discípulos: “estes seminários eram algo que acontecia naquela faculdade”. Sem dúvida, eram realmente um acontecimento, o que não admira, face à craveira científica do Professor de todos nós mestre. Este apontamento surgiu-me por associação de ideias a propósito de fontes.
Prometo para a próxima vez não ser tão enfadonha.
E que Agosto continue não muito muito quente.
Confesso que não tencionava voltar ao caso, porque, na verdade, escrever em blogs não tem a exigência de um trabalho académico. Tencionava pura e simplesmente deixar cair a crítica, porque a julgara impertinente. Todavia, com o andar do tempo, resolvi voltar, agora com algum detalhe.
Assim:
1. Quem é Tony Judt? É um dos historiadores que melhor escreveu sobre o século XX. Morreu há pouco mais de um ano, tendo-nos deixado um fascinante testamento político – “Um tratado sobre os nossos descontentamentos”, na tradução portuguesa –, onde não se encontram receitas para o socialismo democrático, sim uma chamada de atenção para a necessidade urgente de se encontrarem soluções à altura do legado da socialdemocracia, valorizando-se o papel do Estado, uma narrativa moral, uma linguagem de fins e meios, a luta contra as desigualdades. Daqui decorre a necessidade de aberto debato, de ideias novas, de espírito crítico, etc, a fim de não se repetirem os mesmos erros do passado.
Os jovens são os seus principais destinatários, visto que são vítimas, hoje, de grandes frustrações nas suas vidas.
E agora vou à tal história da falta de rigor.
Quando citei Tony Judt tinha apenas iniciado a leitura desse importante ensaio, escrito graças à colaboração de ex-alunos que organizaram informação dispersa por vários escritos, tendo o autor recebido muitas sugestões e críticas a textos elaborados ao longo de anos e tendo, também, como tantas vezes acontece em situações semelhantes, tido o suporte da sua família para tal empreendimento.
No entanto, e apesar de se tratar de um ensaio, aí vai agora uma crítica também: todas as epígrafes não expressam os três dados importantes – autor, obra, data – o que não implicou que o autor não desse o aval à referida publicação.
Ainda bem, digo eu, porque se Tony Judt o não tivesse feito, não teríamos o prazer
de ler uma obra tão importante. "Está aqui tudo"…
2. Disse atrás: “Está aqui tudo”. É verdade. Porém, a partir do capítulo IV até ao fim, surgem, parece-me, algumas afirmações que merecerão alguma reserva ou pelo menos alguma discussão.
Vejamos algumas:
1ª – (página 141). “O capitalismo não é um sistema político”, exemplificando que tanto pode aparecer em ditaduras de direita (Chile de Pinochet) como em ditaduras de esquerda (China contemporânea), monarquias sociais-democratas (Suécia)ou repúblicas plutocráticas (USA). Efectivamente pode não ser “um sistema político”, mas tem características comuns que afectam o processo do quotidiano da vida individual, familiar e colectiva, na medida em que “inferioriza”o factor trabalho, e não promove o “bem comum”.
2ª – (página 177). “Em sociedades pós-religiosas como a nossa, onde a maioria encontra sentido e satisfação em objectivos seculares, só atendendo o que Adam Smith chamou os nossos “instintos benévolos” e contrariando os nossos desejos egoístas é que podemos…”produzir entre a humanidade aquela harmonia de sentimentos e paixões que compõe toda a sua nobreza e decência”. Certo, contudo não basta apenas a existência dos bons sentimentos…
3ª – (página 185). Ao falar da globalização, fala-nos dos democratas-cristãos de Ângela Merkel que abdicaram “do seu breve entusiasmo pelo mercado em favor de uma identificação popular com o Estado de mercado social como garantia contra os excessos da finança globalizada”.Hoje, isto não nos parece assim.
Espero com estas notas ter contribuído para o despertar dos leitores que não tenham lido esta obra “tão pouco rigorosa”… o venham a fazer. Como espero também que os leitores me desculpem o humor. E me desculpem ainda se acaso tive alguma falha na sintaxe, fruto de tão à pressa ter escrito estas notas.
Não resisto só mais a uma notinha sobre “as tais fontes”.
Em 1983-84 e em 1987-88, o Professor Vitorino Magalhães Godinho orientou dois seminários livres na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UNL, respectivamente subordinados ao tema “Análise e Teoria das Fontes” e “Portugal: Problemas e Ideias”, frequentados por assistentes, doutorados, professores até do ensino secundário que vinham de fora de Lisboa. Gente que gostava de aprender. Citando um já à época brilhante doutorado em literatura, entre o grupo dos discípulos: “estes seminários eram algo que acontecia naquela faculdade”. Sem dúvida, eram realmente um acontecimento, o que não admira, face à craveira científica do Professor de todos nós mestre. Este apontamento surgiu-me por associação de ideias a propósito de fontes.
Prometo para a próxima vez não ser tão enfadonha.
E que Agosto continue não muito muito quente.
Almerinda Teixeira
1 comentário:
a dona Ermelinda ganha 3000 euros para fazer serviço para o ...
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