domingo, 31 de maio de 2009

Ser denunciante (II)

Escrito por J. Dias Pacheco (*)
28-Maio-2009
(artigo de opinião inserido no jornal Campeão das Províncias)

É triste ver que poucas são as pessoas que falam com os denunciantes, e as que o fazem é sempre com receio. Outras há que, por terem sido beneficiadas pelos denunciados, sussurram entre si, quando se cruzam com eles nos corredores de um poder em decadência.

Uns olham com despeito - talvez por estarem a colocar em causa quem os protege e lhes concede honrarias - outros sentem pena dos denunciantes, que nunca pensaram passar por algo semelhante.

Fala-se tanto de corrupção, e apela-se à sua denúncia, mas poucos saberão o impacto que tudo isto causa na vida das pessoas. Não são momentos, são dias intermináveis.

Os denunciantes esperam a mão pesada da Justiça, para todos aqueles que transformaram a sua vida no tormento que é. E anseiam ainda mais: que a verdade seja aplaudida, e que a mentira - e o engodo -, fique à disposição de julgadores idóneos e com moral.

Têm esperança nessas pessoas, mesmo sabendo - tal como disse Maria José Morgado, directora do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, a 24 de Junho de 2008, na conferência/debate sobre a “Corrupção e o Poder Local”, promovida pela Associação para o Desenvolvimento Económico e Social / SEDES (a que se referiu a edição do Público do dia seguinte) - que “há dificuldade da sociedade portuguesa em compreender a denúncia”, e o que a preocupa é que “os tribunais deixam os denunciantes entregues a si próprios; sem celeridade nestes casos, sendo vital uma decisão rápida, pronta, clara.”

É evidente, tal como respondeu a directora do DIAP de Lisboa, em entrevista ao Diário Económico” de 6 de Agosto de 2008, que não convém envolver-se emocionalmente com os processos que investiga. Segundo ela, não é difícil: “Temos de estar preparados para ter distância em relação aos casos. Estes não podem ter sentimentos, embora exijam o conhecimento do aspecto humano, porque estamos sempre a decidir sobre pessoas, sobre a vida das pessoas e sobre a culpa das pessoas. A pessoa é sempre a questão central do processo.”

Apesar do tempo decorrido, resta aos denunciantes a possibilidade, ou, melhor, o direito, de se dirigirem às únicas pessoas em quem devem confiar, que sempre terão a obrigação de os ajudar.

Não lhes ocorre nada de especial, que devam dizer, para além do que já deram conta, cumprindo uma obrigação cívica, um ónus de cidadania. É aquilo que ainda sentem, com maior tristeza e desencanto, mesmo ouvindo Marcelo Rebelo de Sousa, a 29 de Março de 2009, afirmar que quem é constituído arguido no exercício das funções públicas tem o dever ético e moral de se demitir.

Ainda que tentem esconder a sua amargura, mesmo que lhes digam que darão uma imagem de fraqueza e desalento, sabem como é difícil fazê-lo. E, ao dizerem isto, não o fazem de forma a condicionar a actuação que se impõe. É apenas uma evidência.

Como é possível que quem denuncia se tenha de esconder ou ir-se embora? Como é que se admite que o arguido, em posição hierárquica acima do denunciante, continue a exercer funções e a sua autoridade sobre quem o denunciou? E o que dizer daqueles que, não sendo ainda arguidos, executam as represálias impostas por quem os nomeou?

Parece-me que a Justiça confia muito no discernimento dos denunciados e de quem os serve. A retaliação vê-se pelos gestos, sente-se nas palavras verbalizadas por quem actua a seu mando. E as atitudes falam por si. Não se demitem - ninguém os convida a sair -, e tudo se passa como se nada fosse com eles.

A Justiça admite este cenário, daí o artigo 4.º da Lei n.º 19/2008, de 21 de Abril. Mas o que faz? Protege os denunciantes? Afasta os corruptos do cenário do crime? Não. Permite o vexame e a humilhação dos denunciantes entregues a si mesmos.

A Justiça, que estimula cada cidadão a denunciar os crimes de corrupção, é a mesma que pode mandar para casa, com atestado médico, os denunciantes, que, condicionados pela demora das investigações, dão-se conta de uma carreira profissional prejudicada por gente sem história nem memória.

É preciso fazer algo por estas pessoas. Se ainda existe um Estado de Direito democrático, este nunca poderá abandonar quem foi capaz de dar o rosto por ele, sobretudo quando está em causa a boa gestão da coisa pública local.

Mais do que um discurso, que muitos repetem, é uma nova prática que se impõe. Para bem de todos, e até dos arguidos, sobretudo quando ainda continuam em funções.

(*) Jurista

Se não leu antes, veja agora, também, o artigo anterior: Ser denunciante!
Imagem: retirada DAQUI.

18 comentários:

Macaco disse...

O meu comentário nada tem a ver com este texto, como sempre interessante. Constatei no entanto, que o Curioso nunca mais apareceu a defender a Dama, desde que lancei alguns dados.Parece-me que esse fulano é professor, já foi autarca e é deputado municipal. Não ganha menos do que 3000 por mês. A mulher ganha o mesmo. Defende com unhas e dentes a Emilita, embora ela o deteste, segundo averiguação secreta.quem será? eu sei mas não digo. Um dia direi.Estes comunistas de Almada são do piorio. Já agora atenção às mesas de voto. porque os facínoras destes comunas aburguesados costumam enganar-se na contagem dos votos. Atenção aos macacos dos comunas almadenses.Fico satisfeito é nas eleiçoes legislalivas. Almada terra vermelha, onde? ficam em terceiro lugar, atrás do PSD, nem abrem o pio. Nas autarquicas é vê-los mobilizarem-se para defender o tacho individual, não a população. A última, o jeronino veio defender o Cavaco. Não acredito, esqueceu-se quando ele era 1º ministro ou os comunas estão também ligados ao BPN?hummm

Isabel Moreira Rego disse...

Eu nada tenho haver... mas há muito por ai que tem...

Minda disse...

Macaco:

Não sei a quem se refere. Mas acha que isso é relevante? Estava eu tão descansada e veio você lembrar-me dessa personagem que só aparece quando quer lançar polémica.

Minda disse...

Isa:

Não tem nada a ver? Nem sabe a sorte que tem...

Isabel Moreira Rego disse...

Amiga todos ( os grandes têm um preço) se é a isto que chama de corrupção? Então digo-lhe: só o povo que nada tem para dar, a não ser a sua força de trabalho, não tem a oportunidade de ser corrupto. A corrupção, a meu ver, começa na justiça. E sabe lá a que preço???!!!

P.S. Afinal nós sempre convivemos com a corrupção! E para haver injustiça basta que o corrupto seja um leão e o denunciante um pequeno ratinho.

Anónimo disse...

Todo o ser humano tem um preço.
Só que há preços tão elevados que se tornam incomportáveis.
É o meu caso.

Isabel Moreira Rego disse...

Observador, eu não sabia que ai vinhas, mas com essa cara de leão... não sei não...rsrssrsrsr

Anónimo disse...

Isa (outra vizinha!)

Onde é que está um leão?

:)

Isabel Moreira Rego disse...

Observador, se não é leão é lobo. Qual é a diferença? Espera estou confusa???!!! Os leões andam durante o dia e os lobos à noite. Estarei enganada? Há há... estes meus oculos!!!
Desculpa se não olhei bem para a tua cara...rsrssrs

P.S. Temos de rir... nem que seja de nós... porque há aqueles que já nem nos fazem rir.

Minda disse...

Isa:

Se é verdade que todos têm um preço (teremos decerto!) nem todos terão princípios... Quero eu dizer: ter um preço não é mau se isso não cercear direitos de outros, ou nos faça cometer ilegalidades. Nem todos os negócios têm falta de ética.

Minda disse...

Observador:

Pensar que apenas os que não têm preço são sérios, está errado. O uso pejorativo da expressão transforma qualquer pessoa que saiba do seu valor (e, porque não, preço) num bandido corrupto.

Mas, na minha óptica, o termos um preço (mesmo que seja comportável) não significa que nos vendemos "a qualquer preço"... pode querer dizer, apenas, que sabemos quanto valemos... e aceitar que nos reconheçam esse valor não quer dizer que tenhamos que efectuar actos ilegais.

Isabel Moreira Rego disse...

Bonito. Gostei. A filosofia é uma ciência não exacta... portanto 2+2 não são = 4. Da mesma maneira o preço de cada SER humano (na minha prespectiva) nada tem a ver com o seu valor, como pessoa. Mas aquele preço a que um corrupto se vendo em troca de um favor...
Me desculpem aqueles que o fazer por habito... e que mal reconhecem que estão a errar.
Se formos falar em actos elegais estamos perdidos... a não ser que estejamos de acordo com todas as leis. Ou será que alguma das leis não terão sido feita por corruptos?
Como chegamos a tanta miséria até penso que estou confusa e o melhor será baixar os ordenados para levantar a crise. Para isso basta alguém sério criar uma lei. E todos eremos ficar felizes porque lei é lei... e para cumprir!!!

Isabel Moreira Rego disse...

Sei que não vai compreender nada, mas isto não é para ser compreendido por todos. Só por alguns espero.....
jokas

Anónimo disse...

ISA

Nem lobo nem cão.
:)
Eu percebi o toque filosófico da coisa.

Minda

Repito o que disse: todos temos um preço.
E agora confirmo. Temos mesmo.
É uma questão de preço e de oportunidade.
O resto ... é outra coisa. Mais profunda.

Anónimo disse...

ISA

Queria eu dizer que não é lobo nem leão.

Minda disse...

Observador:

Todos temos um preço. Afirmas. E eu não o nego.

Mais disse, e repito também, que ter a noção desse facto não faz de nós corruptos. Porque o meu preço não está acima da lei.

Condenável é os quem mesmo tendo um preço baixo (e aqui, baixo, significa mesmo baixo - moral e eticamente falando) - portanto, facilmente negociável - julgam-se senhores/as de uma "mais valia" que lhes permite assacar o que não valem, mesmo que seja roubando aquilo que é dos outros.

Não sei se me fiz entender...

Porque quem corrompe e quem se deixa corromper são, necessariamente, pessoas "sem valor", sem preço, portanto... isto é, qualquer preço serve! depende, de facto, das oprotunidades que lhes apareçam pela frente.

Anónimo disse...

De acordo.

Isabel Moreira Rego disse...

Claro que se fez entender,
Minda.

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