domingo, 9 de novembro de 2008

Como é possível?

(cliquem na imagem para lerem o documento)
Na sexta-feira passada (dia 7 do corrente mês) realizou-se a audiência do Bloco de Esquerda (partido a que pertenço, como todos vocês já sabem) com a Presidente da Câmara Municipal de Almada, no âmbito do Estatuto do Direito da Oposição e na qual estive presente.

Logo à partida fomos avisados de que teríamos apenas 1h, mas acabámos por ficar mais 45m, naquela que foi uma longa conversa de explanação do que tem sido o percurso político da autarca Maria Emília, e muito pouco se falou, em concreto, dos problemas do concelho, tendo ficado por esclarecer quase todas as perguntas por nós colocadas. Quanto às sugestões que apresentámos (centradas em cinco áreas prioritárias – trabalho precário na CMA, parque escolar, plano de mobilidade, assistência social e habitação), e que foram bastantes (podem consultar AQUI parte das questões por nós colocadas), somos em crer que nada será aproveitado, à semelhança do que aconteceu nos anos anteriores.

Mas, hoje, vou apenas falar, mais uma vez, do problema do trabalho precário na Câmara Municipal de Almada, que começa a atingir níveis inqualificáveis (com sérias injustiças pelo meio) e que, por isso, é um problema que deverá requerer a atenção redobrada de todos os partidos da oposição (não apenas do Bloco de Esquerda) e também, principalmente, dos sindicatos (um tanto ou quanto arredados do problema... ou não mantenham um silêncio comprometido e fomentem, apenas, acções generalistas inconsequentes).

Maria Emília tem, de facto, há que admiti-lo, o dom da palavra. Apresenta uma postura simpática e usa uma linguagem envolvente (informal e descontraída), enquanto nos olha de frente e exibe um sorriso empático. Ou seja, sabe esconder, na perfeição, a irritação que lhe invade a alma quando confrontada com perguntas incómodas (como no caso dos precários) e só no limite demonstra o seu desagrado, o que é perceptível nos gestos nervosos ao escrever as anotações, o leve franzir das sobrancelhas, a acentuar do rubor das maçãs do rosto e, quando já não pode mais ouvir aquilo que considera serem afrontas despropositadas, é traída pelo tom de voz que se eleva e adquire um timbre mais grave, o sorriso que se apaga, as rugas que se acentuam em torno dos olhos e, principalmente, pela brusquidão com que profere o seu discurso.

E foi isso que aconteceu ao abordar a questão dos precários na autarquia que, propositadamente, deixou para o fim da sua exposição de mulher empenhada na política por gosto e convicção, porque acredita na prossecução do bem comum, segundo nos quis fazer crer.

Primeiro, tentou passar a mensagem de que o assunto dos trabalhadores não se enquadrava no âmbito da reunião, minorando-o, porque era de mera gestão corrente e ela estava ali para ouvir o nosso contributo na apresentação de sugestões que tivessem a ver com a população em geral e não com um número reduzido de pessoas. Como nós conseguimos demonstrar que nas Opções do Plano e Orçamento esta é, até, uma questão enquadrada numa das Linhas Estratégicas definidas pelo município, teve de admitir que tínhamos razão e lá pude acabar por expor a situação (vejam AQUI o fundamental da minha intervenção).

Depois de nos ter feito ouvir uma longa explanação sobre aquilo que têm sido as maravilhas da gestão CDU em Almada, de como a visão do seu partido para o concelho é a acertada e de como a população reconhece essa suposta verdade (embora quando trouxemos à colação o porquê de não haver em Almada Orçamento Participativo, um município que fala tanto em fóruns de participação cidadã, tivesse acabado a falar-nos das virtudes das “assembleias populares” dos finais da década de 70 do século passado para nos explicar que sabe bem o que é a partilha de poder mas que, agora, a assunção de responsabilidades deve caber, em exclusivo, aos órgãos autárquicos) Maria Emília transfigurou-se ao falar do trabalho precário na Câmara Municipal de Almada.

Escandalizada afirmou, peremptoriamente, que “a CMA não comete ilegalidades”. Todos os trabalhadores estão “devidamente enquadrados”. “Não há quaisquer irregularidades na contratação de pessoal”. Os nossos dirigentes sabem o que fazem. Até porque se fossem instruídos no sentido de ultrapassar a lei saberiam que estavam a cometer um crime. “Além disso, o poder político não interfere nessas questões de gestão corrente”.

E deveras aborrecida afirma: “fazemos sempre concursos e tudo decorre no estrito cumprimento da lei. Na CMA não existe trabalho precário nessas condições que o BE diz. Nem tão pouco pessoas exercendo funções fora da sua categoria”.

Olhando-me olhos nos olhos, como se por agir assim eu não tivesse hipótese de duvidar das suas palavras, Maria Emília continua: “Existem alguns avençados mas eles são, sobretudo, médicos e enfermeiros, e os contratados a termo têm a ver com o problema da mobilidade no sector dos cantoneiros. Quando há um caso especial – motoristas, por exemplo, sou eu própria que despacho, porque não podemos parar um serviço por problemas desta natureza. Vocês têm os dados. Já os enviámos.”

Contra-argumento que não é isso que os números dizem (e estes são retirados da análise do Balanço Social da CMA e das Contas do Município referentes ao ano de 2007, completados com os dados do Orçamento de 2008).

Além do mais, continuo, “20% do pessoal técnico em situação precária é um valor muito elevado. Só entre os técnicos superiores temos 27% com contratos de prestação de serviços. E eles estão, ao contrário do que a senhora presidente afirma, no sector de administração geral e no departamento urbanístico para o qual foi previsto, para este ano, um reforço substancial de verbas” – como podem verificar pela leitura dos documentos integrados neste texto.

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E não desarmei: “mas não somos só nós a dizer que na CMA existem falsos recibos verdes e pessoal a desempenhar funções de nível superior à categoria que detém. A própria Comissão de Trabalhadores da CMA assim o tem denunciado, em particular nos seus dois últimos comunicados. Chegaram mesmo a reunir com a vereação e foi-lhes prometido que até final do ano essas situações estariam resolvidas, o que acaba por ser a assunção de que existem.”

Para nosso espanto, Maria Emília acaba, em sua defesa, por denegrir a acção da Comissão de Trabalhadores da CMA menosprezando o teor dos seus comunicados de 7 e 21 de Outubro último dizendo: “não julguem que por eles serem da nossa facção que tudo o que escrevem é para ler.”

Ao que eu argumentei: “mas a nossa posição não advém apenas do conhecimento destes casos através dos comunicados da Comissão de Trabalhadores, senhora Presidente. Conhecemos exemplos concretos. Por isso, pode crer, sabemos do que estamos a falar.”

Claro que a reunião acabou num ápice. Alegando o excesso de tempo que já estivera connosco, mais 45m do que o previsto, e de que tinha gente à sua espera, Maria Emília levantou-se e iniciou os cumprimentos finais. Educados, sim, mas tensos.

E apesar de na despedida os gestos serem novamente cordiais e o sorriso ter voltado ao rosto de Maria Emília, não pude deixar de lhe dizer: “gostei desta conversa olhos nos olhos senhora presidente. Mas pode crer, mesmo, que sei do que estou a falar.” As razões são óbvias... é que, assim, fiquei com mais força, ainda, para desmascarar o que se passa na CMA.

Mas deixem que vos confesse o meu espanto. Como é possível tanta desfaçatez? Ou a presidente da Câmara está, intencionalmente, a esconder a incompetência dos dirigentes por saber que há ingerência do poder político nas tais questões de gestão corrente (e, por isso tem de se mostrar solidária com eles já que fazem o que a CDU ordena) ou, por desconhecer o que se passa, acredita, com sinceridade, que estão a ser cumpridos todos os preceitos legais.

Todavia, atendendo ao menosprezo dado à actuação da Comissão de Trabalhadores, pareceu-me vislumbrar laivos acentuados de prepotência na voz da senhora Presidente e, como tal, restam-me sérias dúvidas de que esteja, afinal, a dizer a verdade. Mesmo olhando-me nos olhos, não significa que estivesse a ser sincera. Esta é uma técnica que se treina e só os incautos se deixam seduzir por este tipo de comportamento.


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Por isso, não vou ficar de braços cruzados. E esta não será, com toda a certeza, a última acção que irei protagonizar na senda da defesa dos direitos dos trabalhadores precários da CMA, tão vilipendiados por esta que se diz uma autarquia de esquerda e cujo partido anda em campanha nacional levantando o baluarte na luta contra a precariedade... é caso para dizer: “faz o que eu digo não o que eu faço”.

Hipócritas...

1 comentário:

Anónimo disse...

Será que os funcionário da CMA ainda não se deram conta de que estão perante um regimente autocrático, ou seja, a utocracia literalmente significa a partir dos radicais gregos autos (por si próprio), kratos (poder), poder por si próprio. É uma forma de governo na qual um único homem ( neste caso uma mulher)detém o poder supremo. Ele tem controle absoluto em todos os níveis de governo, sem o consentimento dos governados ou manipulando o consentimento dos governados (sendo esta última hipótese mais sec. XXI) O sentido do termo tem uma denotação histórico concreto e política que convergem em muitos pontos.Politicamente, autocracia é um termo que denota um tipo particular de governo absolutista, tendo um sentido restrito e outro mais amplo. O restrito e mais exato reporta-se ao grau máximo de absolutismo na personalização do poder. O sentido amplo é de um governo absoluto com poder ilimitado sobre os súbditos, que apresenta uma grande autonomia em relação a qualquer instituição e aos governados. Ou seja permite a quem tem o poder fazer o que quer.

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