Na passada quinta-feira, dia 20
de agosto de 2015, foi publicado o Despacho
conjunto n.º 9507-A/2015 da Ministra de Estado e das Finanças e dos
Secretários de Estado da Cultura e da Administração Local. Quarenta e um dias
após a publicação de um outro, o Despacho
do SEAL de 9 de julho de 2015, que o de agosto vem completar, o qual, por
sua vez, fora conhecido decorridos trinta e cinco dias depois de o Governo
ter sido informado de que a Assembleia Municipal de Lisboa rejeitara a
Universalidade da Assembleia Distrital.
Ou seja, entre o saber que o
património (predial e cultural), ativos e passivos financeiros, serviços abertos
ao público e pessoal da Assembleia Distrital de Lisboa se iria concretizar a
favor do Estado português, e apesar de conscientes de que havia uma
trabalhadora com salários em atraso há meses consecutivos, ainda assim o
Governo demorou 35 dias para emitir um despacho evasivo (o
de 9 de julho) e mais 41 dias para identificar quais eram, em concreto, as
Entidades Recetoras que, na Administração Central, iriam receber aqueles bens.
Mas, à exceção da consolidação da
mobilidade dos trabalhadores da Assembleia Distrital que se encontram a exercer
funções no Município de Lisboa desde 01-11-2014, conforme assim o determina o
n.º 2 do Despacho
n.º 9507-A/2015, será que podemos mesmo considerar que o assunto está
encerrado ou existirão, ainda, muitas questões por clarificar?
Na prática temos que a Secretaria
de Estado da Administração Local necessitou de 76 dias para dar como concluído
o “processo de reorganização qualificado como de extinção” referente aos
Serviços de Cultura da Assembleia Distrital de Lisboa e mesmo assim preferiu lançar
a suspeita sobre a veracidade do passivo financeiro da entidade dando a
entender que se trata de meras “alegações de eventuais créditos laborais
reclamados em montante indefinido” e não representam um direito efetivo carecendo,
por isso, da prévia aferição da Secretaria-Geral do Ministério das Finanças
como se as informações prestadas pela Assembleia Distrital não fossem de
confiança e as dívidas aos trabalhadores um possível embuste.
Se para chegar a esta “brilhante conclusão”
o Governo demorou dois meses e meio, quantos mais meses serão precisos para que
o Estado vá auditar as contas da Assembleia Distrital e confirmar a existência daqueles
compromissos?
E sobretudo, quantos mais meses decorrerão até que a SG do MF satisfaça os créditos
laborais aos trabalhadores, nomeadamente à funcionária
para quem o mês de agosto será o 12.º sem vencimento?
Tendo-se chegado à assinatura do
despacho e à sua publicação oficial, não seria de esperar que os Serviços das
várias entidades envolvidas estivessem já informados da situação e, de imediato,
pudessem proceder à regularização da situação mais premente que é, sem margem
para quaisquer dúvidas, a da trabalhadora que foi agora colocada em situação de
requalificação e tem, nesta data, 11
meses de salários em atraso, dois subsídios de férias por receber e 24 dias de
férias não gozadas e não pagas?
Pois é. Acontece que, contudo, contactada
a Direção-Geral da Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas e a Secretaria-Geral
do Ministério das Finanças na sexta-feira passada, nem uma nem outra sabiam o
que se passava. Aliás, nem sequer tinham conhecimento do despacho em causa.
Isto significa que apesar de
sempre ter sido uma funcionária cujo mérito profissional foi por diversas vezes
reconhecido, como
o seu currículo o demonstra, Ermelinda Toscano (a técnica superior que
agora foi colocada em situação de requalificação) esteve:
Com dez meses sem vencimento e
com dois subsídios de férias por pagar, além de 24 dias de licença por gozar, como
trabalhadora da Assembleia Distrital de Lisboa;
A que se juntou o mês de julho
também sem receber ordenado e desconhecendo quem no Estado era, afinal, a sua
entidade empregadora (isto depois de publicado o despacho de julho que
transferiu a Universalidade da Assembleia Distrital para o Estado português);
E, agora, publicado o despacho da
passada quinta-feira, são mais 20 dias de salário que ficam por pagar, e sem
perspetivas de quando passará a receber os 60% da remuneração a que tem direito
como “trabalhadora em requalificação” já que o INA ainda não a reconhece como
tal por não ter conhecimento oficial daquele despacho.
Onde cabe aqui o princípio da “boa administração” (artigo 5.º do Código
do Procedimento Administrativo) que determina, especificamente, que a “Administração
Pública deve pautar-se por critérios de eficiência, economicidade e celeridade”?
Isto já para não falar do que terá sido feito do respeito pelos direitos dos
trabalhadores pois é evidente que esses foram, há muito, confiscados.
Todavia não se ficam por aqui as questões
que o Despacho n.º 9507-A/2015 suscita. Vejamos mais umas quantas:
Nos termos do n.º 4 cabe à
Direção-Geral do Tesouro e Finanças proceder “ao registo do imóvel [3.º andar
do n.º 137 da Rua José Estêvão, em Lisboa] na Conservatória do Registo Predial
e na respetiva matriz predial”. Mas se o edifício onde aquela “fração” se
insere não está em propriedade horizontal e corresponde a parte de um prédio
urbano que não possui sequer licença de utilização porque o processo nunca foi
concluído na Câmara Municipal (e assim se mantém há mais de quarenta anos) e
esse facto tem impedido a alteração do registo predial no qual consta, ainda, uma
casa apalaçada, sede da Junta de Província da Estremadura, muito gostaríamos de
saber como irá a DGTF cumprir esta determinação. Até porque sendo o imóvel em
causa propriedade do Estado, que sentido faz esta determinação?
No n.º 5 é interessante a autorização
concedida à Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas para
celebrar “um contrato de comodato com o município de Lisboa, com a condição de
que este assegure a conservação e preservação” do “arquivo e espólio cultural
da Assembleia Distrital de Lisboa bem como os serviços abertos ao público”
presumindo-se a referência feita ao acervo do Arquivo Distrital, da Biblioteca
e do Setor Editorial.
Ora se foi precisamente o
Município de Lisboa:
Que levou a Assembleia Distrital à
falência e provocou a existência de salários em atraso por meses consecutivos
(numa decisão
pessoal do ex-presidente da autarquia António Costa, assumida por mero
capricho político à margem da lei e à revelia dos órgãos autárquicos);
Que rejeitou
a Universalidade da Assembleia Distrital alegando, entre outros fundamentos
que não correspondiam à verdade (como o de a ADL não ser proprietária do 3.º
andar do n.º 137 da Rua José Estêvão, em Lisboa,) que os
equipamentos culturais (Arquivo e Biblioteca) não interessavam ao município
devido às suas características e ao estado de conservação do seu acervo (veja
aqui a resposta
da ADL ao ofício da vereadora Graça Fonseca);
Mantendo-se nos órgãos executivo
e deliberativo do Município os mesmos autarcas que deliberaram rejeitar o
património cultural da Assembleia Distrital e que não se coibiram de utilizar
falsos argumentos para justificar essa posição política tecnicamente infundada
(lembramos que a apreciação sobre o estado de conservação do acervo do arquivo
e da biblioteca não foi precedida de nenhuma avaliação e não teve relatório
técnico de sustentação desconhecendo-se
os critérios utilizados pelo senhor Secretário-Geral da CML responsável
pela emissão de tal opinião), como pode o Governo condicionar as hipóteses de
celebração de eventuais contratos de comodato apenas com a Câmara Municipal de
Lisboa?
Finalmente uma última observação
(que não encerra o capítulo das inúmeras dúvidas que o presente despacho se nos
coloca):
No n.º 8 é enunciado o valor “não
inferior a 134.420,00€” como sendo os “créditos da Assembleia Distrital sobre
os municípios associados, nomeadamente os que resultem da aplicação do artigo
9.º da Lei n.º 36/2014, de 26 de junho”. Mas teria sido importante identificar
a autarquia devedora: a Câmara Municipal de Lisboa.
Esta referência tem implícita a
aceitação de que terminara a 30 de junho de 2014 a obrigação dos municípios contribuírem
para a Assembleia Distrital pois aquela quantia corresponde às quotas de
janeiro de 2012 a junho de 2014 que o Município de Lisboa se recusou a pagar
por ordem expressa de António Costa.
Tendo sido essa a conclusão do Tribunal
Central Administrativo Sul, conforme Acórdão de 15 de janeiro de 2015 (que a partir de dia 1 de julho as Assembleias Distritais estavam proibidas,
nomeadamente, de arrecadar receitas e efetuar despesas), é estranho que o
Governo não reconheça às restantes autarquias o direito a serem ressarcidas das
quantias que pagaram após essa data como a ADL sugere no seu Relatório
e Contas de Encerramento (24-07-2015) já que apenas refere que o
passivo da entidade é composto por “alegações de eventuais créditos laborais”.
E mais grave ainda (embora coloquem a questão no condicional e frisem ser o resultado do que se conhece até ao momento) é o facto de, ao que parece, o
Governo ter resolvido excluir da composição do passivo da Assembleia Distrital
o compromisso assumido com o advogado da Assembleia Distrital pois que sendo um
profissional independente não se pode considerar o crédito que tem a haver como
sendo de origem “laborar”. Um lapso que não se compreende e não tem qualquer
justificação pois esta informação consta do Relatório e Contas de Encerramento (24-07-2015) atempadamente enviado ao senhor SEAL e cuja receção foi confirmada por um seu assessor.
Por tudo o que atrás expusemos (e
pelo muito mais que ficou ainda por escrever mas contamos em breve desvendar)
consideramos que a história da Assembleia Distrital de Lisboa está longe de
concluída. Encerrou-se um capítulo mas estamos longe do fim.
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