domingo, 25 de janeiro de 2009

"Diz que é uma espécie de Câmara de Esquerda..."

...Município de Almada


«A responsabilidade política dos governantes constitui o fundamento das obrigações políticas dos cidadãos, no sentido em que as regras de conduta responsável a que os governantes estão vinculados são também as regras da legitimidade política. (...) Um poder justo e responsável justifica as obrigações políticas dos cidadãos; um poder opressivo e despótico legitima a ruptura.»
Pedro Lomba, in
Teoria da Responsabilidade Política

Muito haveria para contar sobre esta matéria. Todavia, vamo-nos centrar nas questões relativas à gestão dos recursos humanos: sobretudo as da precariedade mas, também, as injustiças que na CMA estão a ser cometidas a todos os níveis, embora as mascarem a coberto de uma culpa que o executivo CDU diz ser exclusiva do Governo, como forma descarada de desresponsabilização dos seus autarcas e a justificação adequada para desculpar a evidente incompetência dos seus dirigentes que, ao que tudo indica, assim agem a coberto de instruções do poder político local.

Apesar de M.ª Emília continuar a afirmar que a CMA não apoia o trabalho precário, o certo é que a taxa de precariedade global (número de contratados a termo resolutivo e em regime de avença ou tarefa, por número total de trabalhadores) subiu de 9%, em 2007, para 12%, em 2008. E este número aumenta, exponencialmente, se for analisada a situação por grupos profissionais, como é o caso dos técnicos superiores, de entre os quais 28% estavam, em 31-12-07, com vínculos precários, sendo que a quase totalidade eram avençados.

Um contrato de prestação de serviços (avença ou tarefa) não é, por si só, se celebrado nos termos da lei, uma forma de trabalho precário, todos o sabemos. Mas o caso muda de figura se o contratado acaba por desempenhar as suas funções nas instalações da entidade, cumprir horário de trabalho e obedecer à hierarquia e disciplina dos serviços, como acontece com muitos dos técnicos que, na CMA, satisfazem necessidades permanentes e regulares da autarquia, nomeadamente nos sectores do Urbanismo, Cultura e Desporto.

Além da sonegação dos seus mais elementares direitos (segurança social e apoio no desemprego), este pessoal vive em permanente instabilidade (podem ver o seu contrato unilateralmente terminado a todo o instante e sem direito a qualquer indemnização), uma condição que confere à CMA o conveniente poder de os manter amordaçados...

Até ao momento em que, num ímpeto de coragem e revolta, um de entre este pessoal acabe por denunciar a sua situação, como aconteceu em finais de 2008 quando um técnico superior que exercia funções há dez anos consecutivos no Museu da Cidade como “falso recibo verde” resolveu recorrer às instâncias judiciais adequadas por ter sido “despedido” sem uma única explicação, muito embora a qualidade do seu trabalho tivesse sido, por diversas vezes, publicamente reconhecida e elogiada.

E se o factor mobilidade poderá justificar a contratação de trabalhadores a termo resolutivo na área dos cantoneiros da limpeza (hoje, assistentes operacionais), o mesmo já não se passa em outras carreiras para as quais a CMA tem recorrido, habitualmente, a esta forma de trabalho temporário – do total de contratos a termo existentes em Outubro de 2008, 74% haviam sido celebrados para prover à substituição de pessoal que desempenhava funções permanentes, logo, situações dificilmente enquadráveis na legislação então em vigor.

Não se ficam por aqui as ilegalidades cometidas pela CMA ao nível da gestão dos seus recursos humanos. Mas se apenas estas fossem, seriam mais do que suficientes para evidenciar a demagogia de um partido (PCP) que “prega aos quatro ventos” defender os trabalhadores quando, na prática, comete os mais bárbaros atropelos aos seus direitos. Sectarismo, prepotência e iniquidade são adjectivos que classificam este tipo de comportamento, o qual urge desmascarar.

Outro tipo de atitudes há, ainda, que podendo até ter alguma cobertura legal (na medida em que não existem normativos que obriguem à resolução destes casos) não deixam de ser condenáveis do ponto de vista da ética. Falamos do facto de na CMA a sua Presidente se recusar, sistematicamente, a reclassificar os trabalhadores que, possuindo habilitações académicas para o efeito, exercem funções de técnicos superiores, alguns há mais de uma década, apesar de o seu posto de trabalho oficial ser de uma categoria muito inferior.

Não sendo a autarquia, de facto, obrigada a proceder à reclassificação deste pessoal, por outro lado não será justo que se sirva dos seus conhecimentos privando-os de auferir a remuneração adequada às suas responsabilidades. Entre um assistente administrativo (actual assistente técnico) e um técnico superior, mesmo que seja na base das respectivas carreiras, existem muitas centenas de euros de diferença no ordenado mensal. Calculem, agora, a dimensão do prejuízo causado, durante anos consecutivos, a estes trabalhadores da CMA e os reflexos insanáveis que isso terá tido (e continua a ter) nas suas vidas pessoais e familiares.

A terminar, que pensar de uma autarquia que informa os seus trabalhadores de que entre 2005 e 2008 não realizaram concursos de promoção por imposição legal, gorando as expectativas daqueles que nesses anos foram satisfazendo os requisitos de passagem à categoria seguinte, quando, afinal, sabiam que essa era uma descarada mentira?

Imoral é a primeira palavra que nos vem à lembrança e incompetência é a segunda que nos ocorre, porque nos fica a séria dúvida se a mentira foi intencional ou se aquela afirmação terá evidenciado, apenas, o quão néscios são os dirigentes da CMA ao ponto de não saberem a diferença entre progressões e promoções, sendo que as primeiras estiveram, de facto, congeladas enquanto as segundas nunca sofreram quaisquer restrições legais.

É que, se numa autarquia com problemas de sustentabilidade económica até se poderia aceitar a implementação de algumas medidas restritivas ao nível dos encargos com o pessoal (mas nunca recorrendo à mentira e escamoteando responsabilidades, muito menos dando a entender que tudo fariam mas a lei e o Governo os impediam de tal), isso é inadmissível numa Câmara que goza de excelente saúde financeira e, ainda por cima, se diz de esquerda. Será mesmo?

Artigo publicado no jornal on-line Setúbal na Rede, dia 23-01-2009

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