O combate à corrupção na gestão autárquica sempre foi uma das minhas principais preocupações como podem verificar pela leitura dos artigos que aqui fui escrevendo ao longo dos anos neste espaço.
E, depois de mais de um mês de
silêncio (devido aos múltiplos afazeres profissionais e particulares), eis que
volto à escrita para denunciar publicamente (após já ter alertado o atual
executivo para os factos que aqui vos vou apresentar e de estar a preparar a
queixa formal a remeter à Inspeção-geral de Finanças e ao Ministério Público) vários
casos que podem configurar a prática do crime de violação do Plano
Diretor Municipal de Almada (instrumento de planeamento territorial
publicado no Diário da República, I
série B, n.º 11, de 14 de janeiro de 1997, e que apenas sofreu alterações
pontuais e nenhuma delas nos artigos 85.º e 91.º que adiante iremos referir).
«Dados contidos no Relatório Global de Corrupção e Transparência
Internacional demonstram que este fenómeno extravasa as fronteiras dos
Estados.
No que se refere a Portugal
a corrupção a nível local autárquico na área do urbanismo e da especulação é
considerada um foco de corrupção permanente verificando-se, mesmo, a nível
governamental.
Com efeito, a corrupção no
âmbito do urbanismo tem uma justificação simples e concreta: é uma área de atividade
de grandes movimentações de dinheiros, operando a “regra de dinheiro fácil” e do
enriquecimento ilícito nos setores privado e público.
Daqui resulta que um
particular predisposto à prática de crimes económicos encontra nesta área de atividade
muitas possibilidades de obter elevados benefícios e proceder ao branqueamento
de capitais de proveniência ilícita.
Na administração local,
funcionários, vereadores e presidentes de câmara, dispõem do poder de elaborar
e aprovar os planos de ordenamento do território e de regulamentar a sua
aplicação, ou seja, o poder de decidir em matéria de urbanização, alteração do
uso do solo e licenciamento de obras.
Este poder de decisão,
alteração e licenciamento é detido pelos mesmos órgãos ou funcionários que
fiscalizam a violação dessas normas urbanísticas, circunstância facilitada pela
grande proximidade com as entidades que intervêm no processo de desafetação dos
solos integrados em Reserva Ecológica Nacional (REN) ou Reserva Agrícola
Nacional (RAN) ou solos protegidos por planos de outra natureza.
Considerando a subordinação
do poder local ao princípio da legalidade, este problema nem deveria existir,
tendo em conta que a Constituição da República Portuguesa (CRP) preceitua no
seu artigo 65.º, n.º 4, que a utilização do solo deve ser feita em conformidade
com os interesses gerais e na prossecução do interesse público.
Na atualidade é legítimo
afirmar que existe uma grande vulnerabilidade do direito do urbanismo. Veja-se
o caso dos “profissionais da política” a exercerem em simultâneo o cargo de
deputados que acumulam com cargo de titular de órgão autárquico, o que é demonstrativo
de uma promiscuidade nesta área sentida como de muita suscetibilidade à “venalidade”»
(A Violação das
Regras Urbanísticas. Reflexão Crítica, de António Fernando da Cruz Novo,
2013)
Depois da leitura do texto acima,
e a este propósito, antes de expor os casos concretos, não posso deixar de
trazer à colação um artigo que escrevi em 05-07-2013 intitulado: “Será a
ponta do icebergue?” a propósito da detenção de três trabalhadores da Câmara
Municipal de Almada por suspeitas de corrupção.
É interessante, sobretudo, recordar
as palavras da então presidente de Câmara e de um membro da bancada da CDU quando,
em 2009, apresentei na Assembleia Municipal de Almada uma moção sobre a
elaboração do Plano de Prevenção dos Riscos de Corrupção:
«Queria também dizer que em
relação à corrupção nós fazemos da luta contra a corrupção uma forma de estar
no exercício do serviço público. Para nós mais do que um Plano de Prevenção do
risco e gestão, etc., muito bem assumido pela nossa Associação Nacional de
Municípios Portugueses (…), mais interessante do que isso é em cada dia
fazermos de facto da luta contra a corrupção uma forma de estar e de exercer o
serviço público. E eu aqui queria dizer que é isso que acontece no nosso
Concelho e por isso não temos tido situações que infelizmente noutras
localidades e noutras realidades têm vindo à luz do dia e que todos conhecemos
bem.» (Maria Emília Neto de Sousa)
«Relativamente à proposta do
Bloco de Esquerda sobre a luta contra a corrupção, digamos que o Bloco de
Esquerda põe em causa a seriedade e a transparência da Câmara Municipal de
Almada. Entendemos que não o deveria fazer (…). Temos a maior das certezas de
que a transparência da gestão da Câmara não pode ser posta em causa.» (Sérgio
Taipas)
Decorreram mais de dez anos desde
aquelas afirmações. E, entretanto, muita coisa mudou, com destaque para a
quebra do ciclo de governação comunista em Almada (um marco histórico no nosso
concelho). Todavia, ao que tudo indica, aquela maneira de pensar da CDU (julgarem-se
moralmente superiores) manteve-se até ao presente agudizando-se após o dia 1 de
outubro de 2017 (data em que perderam as eleições autárquicas) como as
sucessivas tentativas de denegrir a imagem do atual executivo o têm vindo a
demonstrar (não se coibindo de, para o efeito, recorrer a notícias falsas,
deturpação de factos e interpretações dúbias e falaciosas das decisões assumidas
pela vereação do PS/PSD).
Mas voltemos ao assunto de hoje:
a violação do PDM em Almada.
Ocorrências que a confirmar-se a
atuação criminosa só podem mesmo ter sido praticadas com o envolvimento direto
dos serviços de urbanismo da autarquia: técnicos, dirigentes e quiçá órgão
executivo.
Passo então a expor, de forma
breve, os casos sobre os quais foram já coligidas provas suficientes para
colocar sob suspeita o licenciamento das obras em causa (cujos atos
administrativos que o permitiram podem vir a ser judicialmente declarados
nulos, com todas as consequências que daí advirão para os particulares e para a
Câmara Municipal) justificando o envio de todo o material recolhido à
Inspeção-geral de Finanças e ao Ministério Público (o que farei em breve) para
averiguação da Verdade e adequada responsabilização dos infratores
(particulares e técnicos e políticos da autarquia) na medida em que a
conivência passiva (nada fazer após o conhecimento dos factos) é também
condenável pelo incentivo que dá a este tipo de abusos que, num Estado de
direito democrático, todos devemos expressamente condenar.
O presente texto é ilustrado com
uma imagem de cada uma das situações referidas (e que, lamentavelmente, são
apenas exemplos aleatórios, escolhidos ao acaso após um curto passeio realizado
ao local na quarta-feira passada, de entre muitos outros semelhantes que se
poderão observar numa visita mais minuciosa), mas como é óbvio foram recolhidas
muitas mais fotografias que ajudam a ilustrar, com maior clareza, o que se
passa nos loteamentos das urbanizações citadas e serão enviadas às entidades
atrás referidas.
Entre os lotes construídos
seguindo as instruções do respetivo alvará de loteamento (que, ao que tudo
indica, respeitava o PDM sendo disso prova a constatação de que salvo as exceções
apontadas a construção obedece às regras legalmente estabelecidas) vão
aparecendo vários edifícios em flagrante desconformidade com aquele instrumento
de planeamento do território (os casos apresentados são apenas exemplos
pontuais, mas há muitos mais naquelas duas urbanizações e consta que em muitas
outras freguesias do concelho de Almada).
Quinta de Santa Maria
(Charneca de Caparica)
Espaço urbanizável considerado de
baixa densidade habitacional onde o número máximo de pisos permitido é de
apenas dois, conforme assim o dispõe o artigo 91.º do regulamento do PDM. Apesar dessa norma, o edifício da
fotografia tem três e não dois pisos. Consequentemente, um deles foi construído
a mais. Com autorização de quem?
Quem
beneficiou com esta operação?
Quinta de Santa Teresa (Charneca de Caparica)
Espaço urbanizável considerado de
média densidade habitacional onde o número máximo de pisos permitido é de
apenas quatro, conforme assim o dispõe o artigo 91.º do regulamento do PDM. Apesar daquela norma, o edifício da
fotografia tem cinco e não quatro pisos. Consequentemente, um deles foi
construído a mais. Com autorização de quem? Quem beneficiou com esta operação?
Costa de Caparica
Área urbana consolidada onde o
número de pisos das novas construções é calculado através do “valor modal das
alturas das fachadas da frente edificada do lado do arruamento onde se integra o
novo edifício” conforme consta do n.º 2 do artigo 85.º do PDM. Ou seja: como naquelas ruas predominam
moradias de dois pisos, ambos os edifícios da figura têm no mínimo um piso a
mais cada um. Quem autorizou a sua construção? Quem beneficiou com esta operação?
Finalmente importa referir que,
como se pode constatar pelas imagens captadas através do Street View do Google Maps
as situações ora denunciadas reportam a atos autorizados nos mandatos
anteriores.
Contudo, essa evidência não é de
deixar descansados os membros do atual executivo.
Primeiro, porque são os políticos
de hoje aqueles que representam o Município no presente, independentemente dos eventuais
atos ilícitos terem sido cometidos antes de outubro de 2017.
Segundo, porque apesar da recente
alteração da estrutura orgânica dos serviços municipais, continuam em exercício
de funções a maioria dos dirigentes da autarquia (chefes de divisão e/ou
diretores de departamento) que à época lideravam as unidades orgânicas a quem
cabia emitir os pareceres favoráveis à obtenção das licenças de construção em
causa (e que de forma negligente e/ou deliberada deram o seu aval à violação do
PDM), e não há garantias de que tenham alterado o seu comportamento quanto à análise
deste tipo de processos.
E se assim for, confiando nos
pareceres técnicos dos serviços, é bem possível que no atual mandato o
executivo já tenha aprovado projetos de construção que violam o PDM. E esta é
uma situação intolerável que urge esclarecer.
Rua da
Quinta de Santa Maria – Street View (Google Maps), janeiro de 2015
Rua Eng.º
Henrique Mêndia – Street View (Google Maps), agosto de 2014
Para terminar, mais um excerto da
dissertação de mestrado de António Fernando da Cruz Novo: A Violação das Regras Urbanísticas. Reflexão
Crítica.
«Na nossa opinião, os maiores problemas no sancionamento de
ilícitos da disciplina urbanística não são apenas provocados pelas decisões
que, dia-a-dia, vão sendo tomadas no âmbito dos processos administrativos de
licenciamento, tendo em conta que, muitas vezes, o ataque ao bem jurídico
protegido não se concretiza nesse momento mas antes.
De facto, são vulgares os casos em que uma dada operação de
construção é concretizada sem a licença adequada tendo como pressuposto um
acordo prévio entre promotor e Município no sentido de ser posta em marcha uma
alteração dos planos de ordenamento a qual, quando concretizada, legaliza a
situação, até aí, ilegal.
Mesmo nos casos em que não existe um “pacto” ou “um acordo”17
adequado, entre o que foi licenciado e o que efetivamente foi construído ou
edificado é no mínimo estranho que se “legalize o ato praticado” ilegalmente,
sem dificuldade pela administração ou, em determinadas situações, pelos
tribunais.
Com efeito, ainda que tenha sido perseguida a ilegalidade e exista
uma sentença declarativa de nulidade18 do licenciamento ou ordem de demolição
da construção, ou edificação ilegal, o que se verifica é que estamos perante
uma situação generalizada de incumprimento, uma autêntica desobediência
judicial, com a cumplicidade dos órgãos da administração que não incentiva nem
atua para a efetiva execução das normas.»
Interessante será observar, doravante, como é
que este assunto irá ser acompanhado pelas diferentes forças políticas
nomeadamente na Assembleia Municipal palco privilegiado para o “teatro partidário”
da nossa praça.
5 comentários:
Qpuem tinha este pelouro será conivente?
Pergunteem àa amelia pardal esteve dois mandatos à frente do peloiro
E a fiscalização ? O tal amigo fiscal de um Pombeiro que fazia?
Anda uma campanha por aí contra um ano da grovenacao PS mas só meia dúzia andam lá. A tipa dos verdes uma Sônia Tchilone fica colada algum vereador para ficar nas fotos uma tipa que só anda a mama para tacho ganhava 2000 no SMAS por 5 horas Trabalho.Meia dizia participam deviam estar sossegados pois os que tão mau trabalho fizeram lecaran a derrota da CDU.Quem acabou com a cidade foi o ex presidente parece querer voltar.
Só não percebo como foi isto permitido. Quem era o vereador responsável? permitem e não são condenados. permitiram a troco de quê?
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