Imagem retirada DAQUI.
A pergunta em epígrafe serve de intróito ao
caso do pagamento irregular das despesas de representação aos dirigentes no
Município de Lisboa (após publicação da Lei n.º 49/2012, de 29 de agosto) e que
tem sido assunto denunciado nos jornais, entre outros, pelo Público.
Pegando no artigo
do passado dia 3 do corrente mês, e nas declarações da presidente da
Assembleia Municipal de Lisboa, Helena Roseta (que, a propósito, é também deputada
na Assembleia da República), não posso deixar de tecer alguns comentários
sobre a questão que o título desta notícia encerra. Mas antes de continuar tenho
algumas palavras a dizer sobre algo que me deixa seriamente intrigada:
Com uma agenda tão preenchida como autarca, presumindo que cumpre efetivamente
as suas funções no órgão para o qual foi eleita (em 2013) antes de ser deputada
(em 2015) – é bom não
esquecer que a AML tem, em média, duas sessões por mês sem contar com as reuniões
da “conferência de representantes” e das “comissões especializadas” – como é
possível que Helena Roseta tenha ainda disponibilidade para exercer com empenho
a missão que lhe cabe como deputada sabendo nós que além da participação nos
plenários pertence à “Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território,
Descentralização, Poder Local e Habitação” e é Coordenadora do Grupo de
Trabalho - Habitação, Reabilitação Urbana e Políticas de Cidades? Diz o povo
que “quando se tocam vários burros algum fica para trás” e nesta situação é por
demais evidente que por mais polivalente que a “deputada autarca” ou “autarca
deputada” seja, não dispondo esta do dom da ubiquidade nem dotes de magia para
conseguir duplicar a produtividade sem deteriorar a qualidade do seu trabalho,
é muito provável que a atenção que dedica a cada uma daquelas funções seja
inferior àquela que a responsabilidade que lhes é inerente exigiria, o que na
minha opinião só contribui para desprestigiar ainda mais a má imagem que a
maioria dos cidadãos já tem dos políticos.
Voltando à questão principal (pagamento
das despesas de representação sem que tenham sido cumpridos os requisitos
legais para o efeito – aprovação prévia do órgão deliberativo do município) e ao
papel da Assembleia Municipal de Lisboa.
Só me ocorre uma palavra para
descrever esta situação: vergonhosa!
Vergonhosa a atitude dos autarcas
que ousaram deliberadamente não cumprir a lei mas, também, vergonhosa a atitude
negligente daqueles que aprovaram os sucessivos orçamentos e as contas do
município sem se terem apercebido da ilegalidade que estava a ser cometida.
Como vergonhosa é, agora, a
tentativa que alguns andam a fazer (nomeadamente aquela que me parece ser a
postura de Helena Roseta) para branquear o problema tentando menorizar a
questão e desculpabilizar quem cometeu a infração, equacionando o problema apenas pela ótica do direito dos trabalhadores receberem aquelas verbas e centrando os esforços
na procura de uma solução que evite sejam obrigados a devolver os respetivos
montantes.
Sendo certo que a maioria dos
dirigentes que receberam as despesas de representação não terão
responsabilidade direta na ocorrência (por o processamento contabilístico, e a
verificação das condições legais para o mesmo se efetivar, não ser uma
competência que lhes caiba), outros há que, resultado das suas funções e
formação académica são tão culpados (ou até talvez mais) quanto os políticos que
autorizaram o pagamento daquela despesa. Será este o caso, nomeadamente, do
Secretário-Geral e dos diretores dos Departamentos Jurídico, de Finanças e de Recursos
Humanos, que só com muita dificuldade conseguirão explicar o porquê da sua suposta
conivência passiva com tal ato, por mais argumentos que do ponto de vista
jurídico possam ser apresentados.
E depois de aprovações sucessivas, ao que tudo indica “de olhos
fechados” (no que a este assunto diz respeito), de orçamentos e contas em que
aquelas verbas vinham consignadas e foram sempre passando despercebidas como se
de facto cumprissem os requisitos da lei para serem pagas, vir agora Helena
Roseta hastear a bandeira da clarificação legal com a “ameaça” de solicitar
parecer à Direção-Geral das Autarquias Locais, como se isso fosse suficiente
para resolver a situação, evitando assim debater as razões que estão na base da
ocorrência e que, na prática, não passou de um desleixo daquele órgão colegial
que não soube cumprir uma das suas principais atribuições (a de fiscalizar a
atuação do executivo), parece-me um comportamento de uma grande hipocrisia
política, à semelhança do de quantos agora se mostram tão escandalizados e só o ficaram
porque houve um vereador que, finalmente, resolveu cumprir a lei e solicitar a aprovação prévia do
órgão deliberativo para o efeito.
Mas se me é permitido perguntar: dado todo este impasse na Assembleia
Municipal (lembro que a proposta não foi ainda aprovada) os dirigentes
municipais têm continuado a receber ilegalmente aquela subvenção ou o seu
pagamento encontra-se suspenso? Note-se, contudo, que não está em causa o
direito destes trabalhadores a receberem despesas de representação mas tão só o
cumprimento da lei quanto à aprovação dos respetivos montantes.
Infelizmente este bem poderá vir
a ser mais um daqueles casos em que os autarcas “safam-se” incólumes e os trabalhadores
“lixam-se” mesmo que entre estes possam existir alguns que devam ser penalizados
pela negligência com que acabaram por cumprir as suas funções. A esses, sinceramente, não me chocaria nada que fossem obrigados a repor as quantias indevidamente recebidas.
E já agora não posso deixar de,
mais uma vez, trazer à colação a Assembleia
Distrital de Lisboa enfatizando a forma como os autarcas do município de
Lisboa (de ambos os órgãos autárquicos: executivo e deliberativo
mas deste último em particular) - salvo raras exceções (BE, PCP e PEV) -
agiram: provocando a falência intencional daquela entidade, a existência de
salários em atraso por meses consecutivos (12 no total) e provocando a passagem de todos os
bens patrimoniais (culturais e prediais) para o Estado, após um conturbado
processo baseado em mentiras e falsos pressupostos a que os partidos atrás
citados, uns mais conscientes do que outros do que se estava a passar, não conseguiram
opor-se de forma eficaz à muralha antidemocrática criada pela subserviência dos
membros do órgão colegial afetos ao partido maioritário (PS), com o apoio do
grupo dos alegados “Independentes” liderados por Helena Roseta que uns meses
depois acabou eleita deputada à Assembleia da República nas listas do Partido
Socialista.
Interessante não deixa de ser verificarmos a dualidade de critérios de
Helena Roseta que agora exige pareceres jurídicos para clarificar a situação
mas em relação à Assembleia Distrital de Lisboa (onde a recusa de António Costa
era uma ilegalidade evidente assim como o desrespeito pelo funcionamento dos
órgãos autárquicos do município – não esquecer que em 2012 enquanto o executivo
e depois o deliberativo aprovavam um orçamento onde se previa o pagamento
integral da quota anual à ADL o presidente da autarquia impediu, por mero
capricho pessoal o pagamento mensal de pouco mais de 4.000€) optou por apoiar a
atitude ilegal do hoje 1.º Ministro, apesar de plenamente consciente da
consequência que sabia estar a recair sobre os trabalhadores pois que participou
na reunião
do plenário distrital onde foi aprovada uma recomendação sobre os salários
em atraso.
Para terminar volto aqui a deixar-vos
cópia do parecer da Comissão
de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo e da Deliberação
da Câmara Municipal de Leiria, documentos que ouso aconselhar Helena Roseta
a ler, assim como os restantes autarcas da Assembleia Municipal de Lisboa, até
porque ali é referido ter existido uma reunião de coordenação jurídica entre a
CCDR-LVT e a DGAL ficando assim a senhora deputada autarca (ou vice versa) a
saber desde já o que pensam sobre o cumprimento da Lei n.º 49/2012 aquelas
entidades.
Sem querer apostar em “teorias da
cabala”, termino com uma frase da declaração de voto contra as despesas de
representação de uma vereadora da CM de Leiria que me fez pensar naqueles
que bem poderão ter sido alguns dos motivos pelos quais em Lisboa, nas vésperas
de um ano eleitoral autárquico (estávamos em 2012 e as autárquicas foram em 2013) e com a austeridade
do Governo PSD/CDS em pleno, houve quem preferisse fingir que a lei não era para cumprir (e a partir daí até aos dias de hoje houve outros condicionantes políticos que fizeram perpetuar por cerca de três anos aquela ilegalidade). Numa autarquia com milhares de trabalhadores (mais de dez mil) o peso dos votos dos
dirigentes e daqueles que por eles podem ser influenciados não é de
menosprezar (será?):
“Atendendo ao disposto na Lei n.º 49/2012, o pagamento das despesas de
representação deixou de ser obrigatório, e como o valor das despesas de
representação no caso do Diretor Municipal ascende a um valor muito elevado e
superior ao que muitos colaboradores do município recebem mensalmente [à época
estava-se a falar de um complemento mensal no valor de 700,23€], face ao
exposto, voto contra no ponto 1.7 e apresento a presente declaração de voto,
designadamente, para os efeitos do n.º 2 do Artigo 28.ºdo CPA.”
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