Como reacção à Moção do Bloco de Esquerda sobre a Precaridade apresentada na última Assembleia Municipal realizada quinta-feira passada (dia 25 de Setembro), Maria Emília de Sousa garantiu aos almadenses que na CMA não haviam trabalhadores precários.
As poucas situações existentes eram pontuais e ocorriam apenas em sectores onde a mobilidade é recorrente (como o dos cantoneiros) ou, então, tratava-se de pessoal afecto a projectos específicos com um horizonte temporal determinado.
E apresentou alguns números que, lamentavelmente, não consegui anotar, à excepção de que haveriam, se não estou em erro, cerca de 68 trabalhadores com contrato a termo certo.
Por outro lado, na mesma sessão daquele órgão deliberativo, o deputado da bancada da CDU Sérgio Taipas insurgiu-se contra o BE por considerar que este partido estava a acusar a CMA de algo que não era verdade.
E como razão para o voto contra da sua bancada apresentou esse facto e, ainda, a falta de coerência do BE (por terem apresentado uma Moção sobre o Código do Trabalho o que era incompatível com a redacção da Moção sobre a Precaridade) além de que estavam a pedir que a CMA fizesse o que já fizera (integrar nos quadros aquele pessoal) e porque exortavam a autarquia a não cumprir a lei da contratação pública.
A culminar o rol de acusações, disse também que o BE estava a querer dados que já possuía e que eram públicos, pois constavam do Balanço Social. (A propósito deste documento bem tentei, no dia seguinte, conseguir um exemplar na Biblioteca ou consultá-lo on-line no site da Câmara ou da DGAL, mas todas as tentativas que fiz resultaram infrutíferas... por isso, se é público, não está acessível ao cidadão comum).
Feita esta apresentação sumária, avancemos...
Comecemos, desde já, pela definição de trabalho precário, pois parece que há por estas bandas muita confusão sobre o assunto.
Que eu saiba (a não ser que esteja errada e tudo o que aprendi na licenciatura, no curso de pós-graduação em gestão autárquica e nas diversas acções de formação profissional que tenho vindo a frequentar, regularmente, desde 1987 – já lá vão 21 anos de experiência na Administração Pública Local) este termo, quando usado de forma genérica, significa tão só e apenas: emprego com vínculo instável ao nível da sua duração, por contraponto àquela que é considerada a base estrutural do trabalho assalariado «cada activo deve ocupar um emprego permanente e a tempo inteiro desde o fim da escolaridade até à idade da reforma» (J. Freyssinet, 1991).
E, quais são, então, no nosso ordenamento jurídico, os contratos enquadráveis nesta tipificação?
Face ao atrás exposto, os contratos a termo resolutivo e os em regime de tarefa (ou de avença, celebrados com particulares, ficando de fora, por razões óbvias, os outorgados com empresas) são, consequentemente, consideradas formas atípicas, ou precárias, de trabalho porque, sobretudo, não oferecem garantias de continuidade e por sobre o contratado pender o espectro da não renovação.
Os dois primeiros porque têm, desde logo, um prazo fixo (e que, comparando com as nomeações definitivas, é sempre curto). Os outros porque, mesmo que a sua prorrogação seja tida como tácita, podem ser feitos cessar a todo o momento pelo empregador (no uso do seu poder discricionário) desde que cumprido o aviso prévio de 60 dias e sem direito a indemnização, em conformidade com o disposto no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 409/91, de 17 de Outubro (diploma que veio aplicar à Administração Local o regime da Administração Central referido no Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro), situações estas que criam incerteza quanto ao futuro profissional do trabalhador, tendo como consequência a instabilidade da sua vida pessoal.
Sendo possível celebrar contratos desta natureza, devem as entidades que a eles recorrem, no entanto, cingir-se a regras específicas (legalmente definidas) incorrendo em ilícito criminal caso a elas não obedeçam.
Os contratos individuais de trabalho na Administração Pública estão disciplinados na Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho, sendo que os rígidos limites à sua celebração estão previstos nos artigos 7.º (contratos de trabalho por tempo indeterminado) e 9.º (contratos de trabalho a termo resolutivo certo).
Debrucemo-nos, agora, sobre o caso específico do regime da prestação de serviços previstos no Decreto-lei 409/91, já aqui referido, e ao qual se aplica, também, a lei geral em matéria de despesas públicas com aquisição de serviços:
O contrato de tarefa caracteriza-se por ter como objectivo a execução de trabalhos específicos, de natureza excepcional, sem subordinação hierárquica, não podendo exceder o termo do prazo contratual inicialmente estabelecido, apenas se admitindo recorrer a este tipo de contrato quando não existam funcionários com as qualificações adequadas ao exercício das funções objecto da tarefa e a celebração de contrato de trabalho a termo certo for desadequada.
O contrato de avença caracteriza-se por ter como objecto prestações sucessivas no exercício de profissão liberal, apenas se podendo recorrer a este tipo de contrato quando não existam funcionários com as qualificações adequadas ao exercício das funções objecto da avença.
Posto isto, é para todos evidente que um trabalhador contratado em regime de prestação de serviços não pode estar sujeito à hierarquia e disciplina dos serviços nem cumprir horário de trabalho. Assim como, não tem direito a receber os subsídios de Refeição, de Férias ou de Natal nem tão pouco tem direito a qualquer indemnização por caducidade do respectivo contrato.
Além do mais, sendo trabalhadores independentes ficam por sua conta e risco as contribuições para a segurança social livrando-se a entidade empregadora de assumir esse encargo.
Logo, considerar que situações como as descritas não são trabalho precário (mesmo que tenham sido cumpridos todos os requisitos legais para o efeito), é desconhecer o significado da palavra precaridade.
E tentar esconder que esta é, infelizmente, uma realidade preocupante na nossa Administração Pública (Central e Local) e não só nas empresas, que mascara situações imorais de pessoas que, ocupando postos de trabalho permanentes, cumprem horário, desempenham as suas funções sob dependência hierárquica e têm contratos precários em vez de vínculos efectivos de carácter permanente, todos concordarão comigo que é uma vergonha para a Democracia, uma afronta à dignidade humana e um atropelo aos mais elementares direitos dos trabalhadores.
Analisemos, finalmente, a situação vivida na Câmara Municipal de Almada.
Disse a senhora Presidente da Câmara que não existe trabalho precário na autarquia e que os munícipes podem estar descansados. Mas vejamos:
Em 2007, segundo se pode ler no respectivo Mapa de Execução Orçamental (disponível no site da autarquia), foram gastos 420.635,85€ com “pessoal a termo certo” e 1.066.987,04€ com “pessoal do regime de tarefa ou avença”. E no Orçamento para 2008 (também disponível no mesmo sítio) foram previstas dotações de 405.398,00€ e de 1.269.511,58€, respectivamente.
Ou seja, cerca de 7% do total dos encargos com “remunerações certas e permanentes” o que, convenhamos, é um tanto exagerado para se referir apenas a uns quantos casos pontuais de sectores com mobilidade acima da média (como o dos cantoneiros) ou a técnicos afectos a projectos específicos de duração limitada.
E não nos podemos esquecer que, nos termos do Classificador Económico das Receitas e Despesas das Autarquias Locais (adaptado do regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 26/2002, de 14 de Fevereiro), há ainda a considerar os custos enquadráveis na rubrica 02.02.14 — “Estudos, pareceres, projectos e consultoria”, na qual se incluem as “despesas relativas a estudos, pareceres, projectos e consultoria, de organização, apoio à gestão e serviços de natureza técnica prestados por particulares ou outras entidades”, nomeadamente, “os encargos com estudos de organização de projectos informáticos e estudos económico-financeiros” (assim o diz a nota explicativa da DGAL que acompanha o CERDAL) onde, em 2007, a CMA gastou 526.892,67€, além da rubrica residual dos “Outros Serviços”, com 5.812.109,09€, na qual acabam por caber uma série de despesas de natureza diversa (entre elas alguns contratos de prestação de serviços) e que, no seu conjunto, representam 37% do total da rubrica “Aquisição de Serviços”.
Se estes números só por si não nos dizem que foi cometido algum acto ilícito ao nível da contratação de pessoal, é verdade, podemos sempre, todavia, duvidar da sua efectiva necessidade face a outras alternativas de vinculação permanente (desde que não se exceda os limites máximos permitidos por lei) e, sobretudo, faz-nos questionar a qualidade da gestão dos recursos humanos na CMA (em particular após se conhecer o relatório da IGAL sobre essa matéria).
Tudo se resumiria a uma mera apreciação do mérito das decisões deste executivo e que, apenas do ponto de vista político nos caberia apreciar (na medida em que, tendo-se cumprido a lei, as opções tomadas seriam criticáveis, unicamente, à face dos valores defendidos por cada uma das partes... e, em democracia, a crítica política, desde que dentro de parâmetros de respeitabilidade entre os parceiros, é imprescindível) não fosse, no entanto, ter chegado ao nosso conhecimento a denúncia de casos concretos de trabalhadores a “recibos verdes” (como são conhecidos os contratados em regime de prestação de serviços, seja tarefa ou avença), alguns dos quais há vários anos consecutivos nessas condições, cumprindo horário de trabalho, sujeitos à hierarquia e disciplina dos Serviços, integrando os mapas de férias e, por vezes, desempenhando, até, cargos de responsabilidade. E não são dois ou três exemplos, não!
Confesso que fiquei chocada. Independentemente do partido político que está no poder, estas situações são sempre condenáveis. Mais condenáveis ainda, na minha opinião, tratando-se de uma autarquia liderada pelo Partido Comunista, aquele que se diz o baluarte da defesa dos direitos dos trabalhadores e que tem levantado como bandeira na reivindicação sindical a luta contra a precaridade... enfim, custei a acreditar. Mas foram-me apresentados argumentos, testemunhos e provas de peso de cuja autenticidade não duvido.
E, num ápice, tudo se encaixou... o relatório da IGAL e até uma certa carta anónima que por aí andou a circular (à qual não dei grande importância mas que, ao saber das conclusões da inspecção me fez, então, ficar com sérias dúvidas sobre a actuação da CMA nesta matéria).
Por isso, insulto à dignidade de quantos trabalham nestas condições, e às respectivas famílias, são as afirmações de que não existe trabalho precário na Câmara Municipal de Almada, quando isso não é verdade.
E provocação gratuita é a CDU dizer que está contra a precaridade e, afinal, praticá-la entre portas... como se essa prática (que não é de hoje – soube que há pessoal nestas condições há dez anos consecutivos) apenas fosse condenável quando praticada na casa dos outros (entenda-se, nas autarquias não CDU, na Administração Central – porque a esse nível de poder apenas o PS ou o PSD chegam –, e nas empresas de direito privado).
“Absolutamente inaceitável e eticamente reprovável” não é fazer uma moção solicitando a um órgão deliberativo que aprove uma recomendação aos executivos autárquicos do concelho para que cumpram a lei. Embora possa parecer uma redundância desnecessária, não é nenhum acto ilícito. Pode-se questionar a oportunidade de apresentação ou o facto de ser generalista, até a sua redacção ou tecer ficções interpretativas daquilo que o BE queria dizer nas entrelinhas, assim como imaginar qual o objectivo a atingir... pode-se, de facto, reflectir sobre todos esses aspectos e dissertar sobre a estratégia política por detrás daquele texto.
Mas, por mais voltas que se dê, “absolutamente inaceitável e eticamente reprovável” é, sim, a atitude da CMA e da bancada da CDU na Assembleia Municipal... era preferível manter o silêncio ou votar contra alegando uma série de outros argumentos politicamente válidos... agora mentir aos munícipes, essa sim, é uma atitude inqualificável.
E desenganem-se os que estão a pensar que isto é só conversa e que nada se está a fazer para desmascarar o que se passa na CMA... Falo por mim: não irei deixar “passar em branco” esta situação, podem crer.
As poucas situações existentes eram pontuais e ocorriam apenas em sectores onde a mobilidade é recorrente (como o dos cantoneiros) ou, então, tratava-se de pessoal afecto a projectos específicos com um horizonte temporal determinado.
E apresentou alguns números que, lamentavelmente, não consegui anotar, à excepção de que haveriam, se não estou em erro, cerca de 68 trabalhadores com contrato a termo certo.
Por outro lado, na mesma sessão daquele órgão deliberativo, o deputado da bancada da CDU Sérgio Taipas insurgiu-se contra o BE por considerar que este partido estava a acusar a CMA de algo que não era verdade.
E como razão para o voto contra da sua bancada apresentou esse facto e, ainda, a falta de coerência do BE (por terem apresentado uma Moção sobre o Código do Trabalho o que era incompatível com a redacção da Moção sobre a Precaridade) além de que estavam a pedir que a CMA fizesse o que já fizera (integrar nos quadros aquele pessoal) e porque exortavam a autarquia a não cumprir a lei da contratação pública.
A culminar o rol de acusações, disse também que o BE estava a querer dados que já possuía e que eram públicos, pois constavam do Balanço Social. (A propósito deste documento bem tentei, no dia seguinte, conseguir um exemplar na Biblioteca ou consultá-lo on-line no site da Câmara ou da DGAL, mas todas as tentativas que fiz resultaram infrutíferas... por isso, se é público, não está acessível ao cidadão comum).
Feita esta apresentação sumária, avancemos...
Comecemos, desde já, pela definição de trabalho precário, pois parece que há por estas bandas muita confusão sobre o assunto.
Que eu saiba (a não ser que esteja errada e tudo o que aprendi na licenciatura, no curso de pós-graduação em gestão autárquica e nas diversas acções de formação profissional que tenho vindo a frequentar, regularmente, desde 1987 – já lá vão 21 anos de experiência na Administração Pública Local) este termo, quando usado de forma genérica, significa tão só e apenas: emprego com vínculo instável ao nível da sua duração, por contraponto àquela que é considerada a base estrutural do trabalho assalariado «cada activo deve ocupar um emprego permanente e a tempo inteiro desde o fim da escolaridade até à idade da reforma» (J. Freyssinet, 1991).
E, quais são, então, no nosso ordenamento jurídico, os contratos enquadráveis nesta tipificação?
Face ao atrás exposto, os contratos a termo resolutivo e os em regime de tarefa (ou de avença, celebrados com particulares, ficando de fora, por razões óbvias, os outorgados com empresas) são, consequentemente, consideradas formas atípicas, ou precárias, de trabalho porque, sobretudo, não oferecem garantias de continuidade e por sobre o contratado pender o espectro da não renovação.
Os dois primeiros porque têm, desde logo, um prazo fixo (e que, comparando com as nomeações definitivas, é sempre curto). Os outros porque, mesmo que a sua prorrogação seja tida como tácita, podem ser feitos cessar a todo o momento pelo empregador (no uso do seu poder discricionário) desde que cumprido o aviso prévio de 60 dias e sem direito a indemnização, em conformidade com o disposto no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 409/91, de 17 de Outubro (diploma que veio aplicar à Administração Local o regime da Administração Central referido no Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro), situações estas que criam incerteza quanto ao futuro profissional do trabalhador, tendo como consequência a instabilidade da sua vida pessoal.
Sendo possível celebrar contratos desta natureza, devem as entidades que a eles recorrem, no entanto, cingir-se a regras específicas (legalmente definidas) incorrendo em ilícito criminal caso a elas não obedeçam.
Os contratos individuais de trabalho na Administração Pública estão disciplinados na Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho, sendo que os rígidos limites à sua celebração estão previstos nos artigos 7.º (contratos de trabalho por tempo indeterminado) e 9.º (contratos de trabalho a termo resolutivo certo).
Debrucemo-nos, agora, sobre o caso específico do regime da prestação de serviços previstos no Decreto-lei 409/91, já aqui referido, e ao qual se aplica, também, a lei geral em matéria de despesas públicas com aquisição de serviços:
O contrato de tarefa caracteriza-se por ter como objectivo a execução de trabalhos específicos, de natureza excepcional, sem subordinação hierárquica, não podendo exceder o termo do prazo contratual inicialmente estabelecido, apenas se admitindo recorrer a este tipo de contrato quando não existam funcionários com as qualificações adequadas ao exercício das funções objecto da tarefa e a celebração de contrato de trabalho a termo certo for desadequada.
O contrato de avença caracteriza-se por ter como objecto prestações sucessivas no exercício de profissão liberal, apenas se podendo recorrer a este tipo de contrato quando não existam funcionários com as qualificações adequadas ao exercício das funções objecto da avença.
Posto isto, é para todos evidente que um trabalhador contratado em regime de prestação de serviços não pode estar sujeito à hierarquia e disciplina dos serviços nem cumprir horário de trabalho. Assim como, não tem direito a receber os subsídios de Refeição, de Férias ou de Natal nem tão pouco tem direito a qualquer indemnização por caducidade do respectivo contrato.
Além do mais, sendo trabalhadores independentes ficam por sua conta e risco as contribuições para a segurança social livrando-se a entidade empregadora de assumir esse encargo.
Logo, considerar que situações como as descritas não são trabalho precário (mesmo que tenham sido cumpridos todos os requisitos legais para o efeito), é desconhecer o significado da palavra precaridade.
E tentar esconder que esta é, infelizmente, uma realidade preocupante na nossa Administração Pública (Central e Local) e não só nas empresas, que mascara situações imorais de pessoas que, ocupando postos de trabalho permanentes, cumprem horário, desempenham as suas funções sob dependência hierárquica e têm contratos precários em vez de vínculos efectivos de carácter permanente, todos concordarão comigo que é uma vergonha para a Democracia, uma afronta à dignidade humana e um atropelo aos mais elementares direitos dos trabalhadores.
Analisemos, finalmente, a situação vivida na Câmara Municipal de Almada.
Disse a senhora Presidente da Câmara que não existe trabalho precário na autarquia e que os munícipes podem estar descansados. Mas vejamos:
Em 2007, segundo se pode ler no respectivo Mapa de Execução Orçamental (disponível no site da autarquia), foram gastos 420.635,85€ com “pessoal a termo certo” e 1.066.987,04€ com “pessoal do regime de tarefa ou avença”. E no Orçamento para 2008 (também disponível no mesmo sítio) foram previstas dotações de 405.398,00€ e de 1.269.511,58€, respectivamente.
Ou seja, cerca de 7% do total dos encargos com “remunerações certas e permanentes” o que, convenhamos, é um tanto exagerado para se referir apenas a uns quantos casos pontuais de sectores com mobilidade acima da média (como o dos cantoneiros) ou a técnicos afectos a projectos específicos de duração limitada.
E não nos podemos esquecer que, nos termos do Classificador Económico das Receitas e Despesas das Autarquias Locais (adaptado do regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 26/2002, de 14 de Fevereiro), há ainda a considerar os custos enquadráveis na rubrica 02.02.14 — “Estudos, pareceres, projectos e consultoria”, na qual se incluem as “despesas relativas a estudos, pareceres, projectos e consultoria, de organização, apoio à gestão e serviços de natureza técnica prestados por particulares ou outras entidades”, nomeadamente, “os encargos com estudos de organização de projectos informáticos e estudos económico-financeiros” (assim o diz a nota explicativa da DGAL que acompanha o CERDAL) onde, em 2007, a CMA gastou 526.892,67€, além da rubrica residual dos “Outros Serviços”, com 5.812.109,09€, na qual acabam por caber uma série de despesas de natureza diversa (entre elas alguns contratos de prestação de serviços) e que, no seu conjunto, representam 37% do total da rubrica “Aquisição de Serviços”.
Se estes números só por si não nos dizem que foi cometido algum acto ilícito ao nível da contratação de pessoal, é verdade, podemos sempre, todavia, duvidar da sua efectiva necessidade face a outras alternativas de vinculação permanente (desde que não se exceda os limites máximos permitidos por lei) e, sobretudo, faz-nos questionar a qualidade da gestão dos recursos humanos na CMA (em particular após se conhecer o relatório da IGAL sobre essa matéria).
Tudo se resumiria a uma mera apreciação do mérito das decisões deste executivo e que, apenas do ponto de vista político nos caberia apreciar (na medida em que, tendo-se cumprido a lei, as opções tomadas seriam criticáveis, unicamente, à face dos valores defendidos por cada uma das partes... e, em democracia, a crítica política, desde que dentro de parâmetros de respeitabilidade entre os parceiros, é imprescindível) não fosse, no entanto, ter chegado ao nosso conhecimento a denúncia de casos concretos de trabalhadores a “recibos verdes” (como são conhecidos os contratados em regime de prestação de serviços, seja tarefa ou avença), alguns dos quais há vários anos consecutivos nessas condições, cumprindo horário de trabalho, sujeitos à hierarquia e disciplina dos Serviços, integrando os mapas de férias e, por vezes, desempenhando, até, cargos de responsabilidade. E não são dois ou três exemplos, não!
Confesso que fiquei chocada. Independentemente do partido político que está no poder, estas situações são sempre condenáveis. Mais condenáveis ainda, na minha opinião, tratando-se de uma autarquia liderada pelo Partido Comunista, aquele que se diz o baluarte da defesa dos direitos dos trabalhadores e que tem levantado como bandeira na reivindicação sindical a luta contra a precaridade... enfim, custei a acreditar. Mas foram-me apresentados argumentos, testemunhos e provas de peso de cuja autenticidade não duvido.
E, num ápice, tudo se encaixou... o relatório da IGAL e até uma certa carta anónima que por aí andou a circular (à qual não dei grande importância mas que, ao saber das conclusões da inspecção me fez, então, ficar com sérias dúvidas sobre a actuação da CMA nesta matéria).
Por isso, insulto à dignidade de quantos trabalham nestas condições, e às respectivas famílias, são as afirmações de que não existe trabalho precário na Câmara Municipal de Almada, quando isso não é verdade.
E provocação gratuita é a CDU dizer que está contra a precaridade e, afinal, praticá-la entre portas... como se essa prática (que não é de hoje – soube que há pessoal nestas condições há dez anos consecutivos) apenas fosse condenável quando praticada na casa dos outros (entenda-se, nas autarquias não CDU, na Administração Central – porque a esse nível de poder apenas o PS ou o PSD chegam –, e nas empresas de direito privado).
“Absolutamente inaceitável e eticamente reprovável” não é fazer uma moção solicitando a um órgão deliberativo que aprove uma recomendação aos executivos autárquicos do concelho para que cumpram a lei. Embora possa parecer uma redundância desnecessária, não é nenhum acto ilícito. Pode-se questionar a oportunidade de apresentação ou o facto de ser generalista, até a sua redacção ou tecer ficções interpretativas daquilo que o BE queria dizer nas entrelinhas, assim como imaginar qual o objectivo a atingir... pode-se, de facto, reflectir sobre todos esses aspectos e dissertar sobre a estratégia política por detrás daquele texto.
Mas, por mais voltas que se dê, “absolutamente inaceitável e eticamente reprovável” é, sim, a atitude da CMA e da bancada da CDU na Assembleia Municipal... era preferível manter o silêncio ou votar contra alegando uma série de outros argumentos politicamente válidos... agora mentir aos munícipes, essa sim, é uma atitude inqualificável.
E desenganem-se os que estão a pensar que isto é só conversa e que nada se está a fazer para desmascarar o que se passa na CMA... Falo por mim: não irei deixar “passar em branco” esta situação, podem crer.
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