quinta-feira, 14 de agosto de 2008

A quadratura do círculo?




Há dias atrás, falando com um amigo sobre várias questões relacionadas com a Administração Pública Local, veio à liça o problema da gestão dos recursos humanos e os compadrios existentes na contratação de pessoal nas autarquias.

E, tendo ambos conhecimento do teor do Relatório Sectorial da inspecção realizada à CM de Almada (que é público – todos o podem consultar na secção das “Acções Inspectivas” – Distrito de Setúbal – Concelho de Almada, da página da IGAL), não podíamos deixar de falar no assunto, dado o imenso rol de irregularidades cometidas.

Na fase do contraditório, a CMA apresentou, claro, uma outra versão interpretativa da legislação para justificar os actos praticados (o respectivo parecer também se encontra disponível para consulta no site acima indicado). Contudo, na minha modesta opinião, dificilmente as justificações enunciadas dirimem as responsabilidades de quem praticou os actos descritos como ilegais pelos inspectores e, por isso, muitas dúvidas ficam por esclarecer depois de ler estes dois documentos (relatório da IGAL e parecer da CMA).

A título de curiosidade, refiro apenas que, entre outras acusações, profusamente detalhadas com referência aos documentos analisados, foram detectadas 14 nomeações de pessoal dirigente (Directores de Departamento e Chefes de Divisão Municipal) que os inspectores classificaram do seguinte modo:

«A nomeação de … por despacho da Sr.ª Presidente da Câmara Municipal de Almada de … encontra-se ferida de vício de violação de lei, gerador de anulabilidade, devendo os factos que lhe servem de fundamento ser participados ao Ministério Público junto do TAF [Tribunal Administrativo e Fiscal] de Almada para os efeitos competentes
(…)
E mais ainda, «verifica-se responsabilidade financeira dos agentes que autorizaram o processamento dos vencimentos, matéria que é objecto de participação ao Tribunal de Contas

Apesar de algumas das ilegalidades detectadas, e provadas, serem suficientemente graves para os inspectores terem sugerido a intervenção do Ministério Público, certo é que não houve, que se saiba, até ao presente, qualquer consequência… para ninguém!

Ou seja, os visados continuam a ocupar os seus postos de trabalho como se nada tivesse acontecido, o executivo camarário julga-se um modelo de gestão e o partido político no poder considera-se um exemplo de boas práticas autárquicas.

E se a isto juntarmos o conteúdo de uma “carta aberta” que anda a circular por e-mail contendo quatro páginas de acusações directas, com exemplos concretos (situações e nomes, inclusive) de sucessivos atropelos à “legalidade democrática” no que se refere à gestão de recursos humanos na CMA (escrito anónimo, é verdade… mas depois de se conhecer os elementos atrás referidos, é natural que as suspeitas se adensem), ficamos mesmo com vontade de perguntar:

Afinal, para que servem estas acções inspectivas?

Tantas ilegalidades na admissão de pessoal são o reflexo da incompetência dos serviços, da intransigência dos inspectores ou sintoma da impunidade sentida pelos responsáveis políticos?

Existem autarcas e dirigentes acima da lei?

A opção política vale mais do que a qualidade técnica e profissional dos trabalhadores?

Qual é a ética de um partido político conivente com práticas condenáveis como as descritas?

Perante as contradições entre o que se afirma no relatório da IGAT e no parecer da CMA, onde está a verdade material dos factos?

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