sábado, 3 de dezembro de 2011

O silêncio dos complacentes

Este é o subtítulo de um dos capítulos do livro Corrupção, de Luís de Sousa, ed. FFMS, uma obra que aconselho todos a lerem.
De seguida apresento-vos alguns excertos que considero merecerem destaque especial.

«O problema da ineficácia do controlo da corrupção em Portugal não é apenas um problema de mau desenvolvimento da Justiça. E falta de vontade política, mas de cultura cívica e de cidadania.
Por um lado, os portugueses prezam os princípios subjacentes a um Estado de Direito democrático e desaprovam a ideia de que os fins justificam sempre os meios. Por outro lado, estão dispostos a abandonar estes mesmos valores quando colidem com os seus próprios interesses. Como explicar esta incoerência?
(…)
De uma forma geral, o que os estudos e inquéritos nacionais e internacionais têm evidenciado é que existe uma condenação social de determinados tipos de actos (suborno, extorsão) e uma tolerância / indiferença para outros (“puxar os cordelinhos” quotidiano ou oferta de prendas). A zona cinzenta que separa estes dois pólos é um espaço de disputa de julgamentos e que permanece uma incógnita.
Como explicar a aparente contradição entre uma opinião pública que por vezes condena, recorrendo a referências morais e ou legais, e que noutras situações absolve os culpados com uma indulgência de quase cumplicidade?
(…)
«Uma das principais inconsistências da condenação social da corrupção é o facto de os cidadãos a condenarem vivamente em abstracto e afirmarem que a denunciariam às autoridades, embora na prática se recolham no silêncio e na indiferença. No que concerne a combate à corrupção, é mais preocupante o “silêncio dos bons” utilizando uma expressão de Martin Luther King, do que as acções dos corruptos e dos sem-ética.
Os quarenta e oito anos de ditadura têm, certamente, influência na forma como o cidadão entende a denúncia e a vigilância. A queixa e a vigilância da sociedade civil são fundamentais para desvendar o pacto oculto que é a corrupção. De acordo com os dados do inquérito Corrupção e Ética em Democracia: o Caso de Portugal de 2006, não obstante a maioria dos portugueses (82,6%) afirmar que denunciariam às autoridades um caso de corrupção do qual tivessem conhecimento, na realidade recolhem-se ao silêncio e à indiferença. Como conclui Ferreira e Baptista (1997), o volume de queixas é quase inexistente e desproporcional à percepção das ocorrências. Porque é que os cidadãos não reagem? Um dos factores explicativos é o facto de se tratar de um crime contra o património do Estado, portanto, sem vítima concreta. Não é certo, porém, que a corrupção seja o único tipo de crime público que suscita passividade por parte dos cidadãos.
(…)
Existe também um problema de literacia e de cidadania activa. A democracia portuguesa goza de uma cidadania informada (ainda que com graves deficiências na qualidade e, sobretudo, no acesso à informação), mas politicamente pouco formada.
(…)
Confunde-se o dever cívico de queixa/reporte com a acusação arbitrária, caluniosa e difamatória.
(…)
Que papel compete à sociedade civil?
(…)
Não basta indignar-se, é preciso actuar. O “bom cidadão” é informado e formado; é inquisitivo e politizado; é solidário e contribuinte; protesta pelos seus direitos e pelos direitos dos demais; participa na vida pública através de vários mecanismos (eleições, associativismo, assistência social, etc.); contesta os procedimentos e decisões da administração, mas também colabora na melhoria dos seus serviços; não pactua com facilitismos, clientelismos e comportamentos venais, exigindo transparência e rigor por parte daqueles que são chamados a exercer o poder que lhes foi delegado para a gestão da res publica. Não é preciso um elenco elaborado das qualidades da cidadania pró-activa para nos apercebermos da discrepância entre o ideal e o que tem sido a prática generalizada dos portugueses.
É claro que o combate à corrupção não pode estar assente em heróis ocasionais. São necessárias estruturas organizacionais cuja missão e objectivos perdurem no tempo e orientem esses esforços individuais para uma acção colectiva forte, credível e sustentável.»

2 comentários:

Anónimo disse...

Sobre corrupção, os JG, WC, etc. não tem comentarios a fazer. São autoridades especialistas no assunto

Anónimo disse...

Mesmo não sabendo quem são esses JG e WC sei que na CMA há políticos e dirigentes que falam em ética e moral mas são uns corruptos de primeira linha... recebem prendas, trocam influências, favorecem amigos, familiares e camaradas seja em concursos de pessoal ou de bens e serviços... praticam crimes como quem se muda de camisa, com a maior naturalidade (peculato é o mais comum)... como os interesses são os seus e os do PCP, isso pouco interessa. São sempre gente séria! Corruptos são os dos outros partidos.

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