Entre
outubro de 2018 e maio de 2019 publiquei neste espaço dez artigos sobre o tema da “violação do PDM de Almada”, a maioria após uma apurada investigação e observação no local
como podem verificar dada a profusão de mapas, relatórios, fotografias, etc. De
salientar que todos os factos reportavam a práticas ocorridas entre 2009 e
2017.
Recolhidas
as evidências indispensáveis, organizadas as provas, os casos foram denunciados
às entidades com intervenção direta na matéria (Câmara Municipal de Almada,
Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo,
Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas) e, também, ao Ministério
Público para averiguar da eventual prática de crimes urbanísticos e outros
(corrupção por exemplo).
Contudo,
o inquérito iniciado com a queixa que enviei à Procuradoria Geral da República
(Processo n.º 4217/18.3T9ALM) em 2018, e que foi desenvolvido pela 4.ª Secção
de Almada do Departamento de Investigação e Ação Penal, viria a ser arquivado por
despacho de 02-12-2020, “porquanto não foi possível ao Ministério Público obter
indícios suficientes da verificação de crime”.
Confesso
que não esperava este desfecho. Embora o MP tenha concluído que o arquivamento
não prejudica a “possibilidade de serem os autos reabertos caso surjam novos
elementos de prova que invalidem os fundamentos ora invocados” e termine
sugerindo que se deveria abrir “Processo Administrativo, tendo em vista a
eventual instauração de ação para proteção de interesses difusos”, o teor do
despacho foi por mim recebido com total surpresa.
E
se o que mais me espantou foi a afirmação de que todas as diligências levadas a
efeito pela Polícia Judiciária tinham resultado infrutíferas (e bem gostaria de
saber quais foram já que delas não se dá notícia no documento em apreço), o
ter-me apercebido de que o tribunal ter-se-á limitado a ouvir a denunciante e apenas
uma testemunha deixou-me perplexa.
Apesar
das fragilidades da investigação, o MP foi perentório ao considerar que “não
existem elementos probatórios de relevo suscetíveis de serem utilizados para
apurar responsabilidade criminal, o que não permite ultrapassar a dúvida quanto
à prática ou não dos factos” o que me faz pensar que, com a justiça a atuar
desta forma, em Almada os prevaricadores estarão sempre protegidos.
Por
outro lado, o empenho em desculpabilizar as irregularidades urbanísticas detetadas
deixou-me incomodada, sobretudo pela imagem que perpassa nas entrelinhas da
decisão do MP, de que tudo não passou de delírios infundados de uma munícipe intolerante.
E,
por isso, um terceiro piso recuado na cobertura de edifícios localizados em
área cujo índice urbanístico só permitia dois andares, passou a ser um sótão legítimo
para arrumos de utilização admissível. Ou, nos casos em que é evidente que esse
terceiro piso excedente não é uma simples arrecadação, a desconformidade face
ao PDM foi desvalorizada entendendo-se como mero “erro na apreciação do
projeto” ou uma “construção à revelia após emissão da licença de utilização”,
como se a autarquia não tivesse quaisquer responsabilidades em matéria de
fiscalização sucessiva, nomeadamente após denúncia concreta.
Estranhamente,
nem uma palavra foi proferida sobre a apreciação dos elementos referentes à
ocupação abusiva em terrenos de áreas protegidas das Reservas Agrícola e
Ecológica Nacionais ou da Arriba Fóssil da Costa de Caparica, apesar da
CCDR-LVT e do ICNF terem confirmado os incumprimentos denunciados.
Na
sequência das notícias que aqui publiquei,
fui insultada nas redes sociais e cheguei a receber ameaças através do
Messenger exigindo que retirasse algumas das publicações (algo a que nunca
acedi). Todavia, mais do que esses comportamentos disruptivos, admito que foi o
conteúdo deste despacho que deu o maior contributo desmotivador no que concerne
a futuras denúncias.
Ainda
assim, desiludam-se os que pensam que esta paragem é sinónimo de desistência.
Trata-se, apenas, de uma pausa para refletir e porque, de momento, tenho outros
interesses em perspetiva, nomeadamente os relacionados com a investigação para
a minha tese de doutoramento, “Divisão administrativa e ordenamento do
território em Portugal: a gestão supramunicipal, entre o paradoxo da
descentralização e o impasse da regionalização”.
Uma
coisa é certa: com este processo aprendi bastante, sobretudo fiquei a conhecer
com quem posso contar. Estou de consciência tranquila e ciente de que fiz o que
podia. Não sou conivente com estas más práticas urbanísticas e/ou atentados à
proteção da natureza. Outros não poderão dizer o mesmo.
Imagem
retirada DAQUI
Sem comentários:
Enviar um comentário