Mercê da “crise energética” criada pela greve dos motoristas de
matérias perigosas, muito se tem falado nesta espécie de “sindicalismo
independente” das centrais sindicais (CGTP-IN e UGT) e dos partidos políticos
que, alegadamente, as controlam (PCP e PS/PSD) e que tem surgido nos últimos anos
em setores tão diversificados como o dos professores, dos enfermeiros e, agora,
o dos motoristas de matérias perigosas.
Apelidado por uns como um “sindicalismo não-alinhado”, mais próximo
das bases do que os seus congéneres, de cariz mais interventivo e que, por não
estar comprometido com o situacionismo (governo / patronato) que leva a acordos
que consideram lesivos dos seus interesses, não se coíbe de recorrer a formas
de luta mais radicais para atingir objetivos.
Se por um lado, apesar de belicoso e intransigente, este
comportamento de confronto direto colhe simpatias, sobretudo por parte dos
associados, que consideram corajosa a forma de enfrentar os poderosos (leia-se:
os patrões exploradores, o governo submisso aos interesses do capital, os
políticos corruptos), por outro lado, são criticados por muitos outros (em
particular a população em geral) como sendo um “sindicalismo selvagem” ou um
“sindicalismo mercenário”, de um corporativismo demasiado egoísta, que não se
importa de atropelar direitos de terceiros para satisfazer os interesses da sua
classe específica.
Conclusão: é urgente refletir sobre esta
questão, de como aqui se chegou e quais são as perspetivas de futuro.
Em democracia, a liberdade de expressão é um direito constitucionalmente
protegido (artigo 37.º da CRP), por isso, apesar de não ser especialista na matéria
vou ousar exprimir o que penso e,
Deixar-vos alguns contributos derivados da minha própria
experiência de cerca de duas décadas, como delegada sindical (STAL) e mais
tarde dirigente sindical (SINTAP), da desilusão que foi esse envolvimento e das
razões que levaram ao meu afastamento de ambos os sindicatos acabando por levar
a cabo uma luta laboral isolada (que viria a vencer, felizmente) porque nenhum
dos dois sindicatos se mostrou capaz de enfrentar, por incúria, incompetência,
indiferença e/ou ligações políticas. Neste mesmo espaço já escrevi
vários artigos sobre esta matéria e onde me questionava se valia a pena
sindicalizarmo-nos.
Partilhar parte de uma breve investigação que realizei e colocar
algumas questões novas para reflexão.
Antes de prosseguir, contudo, convém:
Esclarecer que, embora vá focar a minha análise na “estrela do
dia”, o novel sindicato de motoristas de matérias perigosas, este texto não é
sobre a greve que decretaram e levou à “crise energética” que terminou ontem.
Sobre ela muito comentei na rede social Facebook e penso que nada mais tenho a
acrescentar (os breves textos que escrevi, as polémicas em torno dos mesmos e as
respostas que dei podem ser consultados AQUI
arquivo online onde reuni os mais significantes).
Lembrar que a Constituição
não serve apenas para dizer que o seu texto (artigo 57.º) protege o direito à
greve (como se fosse idêntico à proteção inviolável da vida prevista no artigo
24.º) ou evocar o direito de resistência (reinterpretando, à medida das
conveniências, a redação do artigo 21.º) para justificar atos de radicalismo
pretensamente justicialista.
Em primeiro lugar (artigo 2.º) temos que Portugal “é um Estado de
direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e
organização política democráticas, no respeito e na garantia de efetivação dos
direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de
poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o
aprofundamento da democracia participativa.”
E, em segundo lugar, decorre também da CRP que existem muitos
outros direitos, liberdades e garantias (pessoais, políticos, laborais,
económicos, sociais e culturais) que urge acautelar. Consequentemente, o exercício
desses direitos (além de pressupor, também, o cumprimento de alguns deveres),
obriga a que se encontre o necessário equilíbrio de respeito proporcional para
que a liberdade individual de uns não cerceie a do coletivo (sociedade).
Acresce ainda que,
A verdade e a razão não têm dono, isto é, não estão sempre apenas
do lado dos trabalhadores e nem todos os empresários são oportunistas e
exploradores.
Num Estado de direito democrático, a Constituição deve ser
respeitada na íntegra por isso há que não esquecer que a liberdade de
iniciativa e organização empresarial também se encontram constitucionalmente
protegidas (artigo 80.º) e o Estado somente tem poder de fiscalização da
legalidade e só pode interferir, a título provisório, nos casos expressamente
previstos na lei e, em regra, mediante prévia decisão judicial (artigo 86.º).
A defesa dos direitos dos mais fracos e desprotegidos deve ser
enquadrada na lei, utilizando os instrumentos legítimos para o efeito, e o
apoio às suas justas reivindicações não pode utilizar a mentira como como pilar
de sustentação das posições publicamente assumidas sob pena de
descredibilização dos agentes que dela se servem.
A luta contra as injustiças laborais não tem como único meio de
reposição de direitos a greve, a qual, apesar de caber aos trabalhadores
definir o seu âmbito e de o Estado não o poder limitar (artigo 57.º), não é um
direito absoluto que se sobrepõe a todos os outros, que nunca pode ser
criticado e tem de ser sempre apoiado de forma incondicional sejam quais forem
os motivos que a sustentam e os métodos utilizados pelos grevistas.
Defender a negociação coletiva e apostar no recurso ao diálogo
entre as partes antes de enveredar pela greve não transforma quem assim pensa e
age em cobardes traidores de classe. Esse tipo de discurso, que muito se
assemelha ao “pensamento único” dos regimes ditatoriais (quem não pensa como
nós – os alegados defensores da moral e bons costumes laborais – é porque está
contra os trabalhadores e, portanto, merece o degredo), além de anti
democrático, é profundamente injusto para com aqueles que se empenham em arranjar
alternativas para conseguir alcançar os mesmos objetivos.
Aliás, recorrer à greve como forma de chantagem pura e dura,
marcando posições inflexíveis (exige-se, impõe-se, não se negoceia) é, para os sindicatos,
o caminho mais fácil pois não obriga ao esforço de pensar em soluções criativas
que exerçam igual pressão sobre o patronato e evita que através do diálogo
cara-a-cara se descubram as fragilidades negociais que apresentam. Em
contrário, nos plenários de trabalhadores, no calor do momento, supostamente
“entre iguais”, é fácil aos “bem-falantes” (mesmo sem grandes dotes de oratória)
influenciar os associados (os únicos que sentem na pele as injustiças do
quotidiano) e, recordando a opressão do passado e a ineficácia das lutas
anteriores, apostar nas emoções do presente, apelar à revolta e não medir as consequências
futuras.
Depois das considerações anteriores, meros desabafos de uma cidadã
sem quaisquer pretensões científico-filosóficas, vou-me debruçar sobre o exemplo
da Associação Nacional de
Motoristas de Matérias Perigosas que, por se tratar de uma
associação sindical é conhecida como sindicato abreviadamente designado por:
SNMMP.
Mas trata-se de uma associação profissional/sindical ou de um
sindicato? Qual é a diferença entre ambas as entidades? Podem coexistir em
simultâneo usando o mesmo nome diferenciado apenas pelo adjetivo inicial:
associação ou sindicatos?
Segundo informação retirada da página da Associação a mesma foi
fundada em 21-12-2017, com sede na Av.ª Miguel Bombarda, n.º 36 – 8.º piso –
fração C, em Lisboa (conforme
consta do n.º 1 do artigo 1.º dos respetivos estatutos) a escassos
das instalações sociedade de advogados de Pedro Pardal Henriques, a Internacional
Lawyers Associated que fica na Av.ª Visconde de Valmor, n.º 66 – 3.º
piso.
Cerca de um ano mais tarde, nasce o Sindicato Nacional de
Motoristas de Matérias Perigosas em 08-11-2018, sediado nos
escritórios do advogado Pedro Pardal Henriques (como o comprovam os estatutos
publicados no Boletim do Trabalho e do
Emprego, n.º 41).
Entretanto, associação e sindicato mudam-se para a loja n.º 7 do
Mercado Diário em Aveiras de Cima e adotam o mesmo número de telefone: o
263144785.
Analisemos agora quem faz parte da mesa da assembleia geral. Da
associação:
Imagem n.º 1
E do sindicato:
Imagem n.º 2
Quanto à direção, verificamos que Pedro Pardal Henriques passou de
secretário da Mesa da AG para Vice-presidente da direção do sindicato enquanto
dois dos seis vice-presidentes (o que não deixa de ser um exagero) da direção
da associação passam para a AG do sindicato.
Imagem n.º 3
Curioso é, também, o facto de o sindicato apenas
divulgar três dos cinco membros efetivos da direção eleita em 22-09-2018
para um mandato de quatro anos (até 2022) e de o Tesoureiro nem sequer ser
aquele que foi efetivamente nomeado para o cargo, mas um dos vogais.
Destinando-se o sindicato a representar “os trabalhadores que
exerçam funções de motoristas profissionais de matérias perigosas” mais
estranho ainda é que os dois cargos principais da direção (presidente e
vice-presidente) não sejam exercidos por motoristas: o primeiro é empresário
do ramo (embora a empresa que detinha tenha sido dissolvida no ano
de criação da associação) e o outro advogado
de negócios. Motorista só mesmo o
tesoureiro (função exercida por um dos vogais e não por aquele que
foi nomeado em AG e comunicado à DGERT).
Mas ao ler os estatutos de ambas as entidades encontramos outras
estranhas ocorrências.
No artigo 7.º dos estatutos da associação faz-se a distinção entre
quatro tipos de sócios (os efetivos, honorários, beneméritos e aliados) sendo
que Pedro Pardal Henriques (e já agora também Francisco São Bento), por não
serem nem terem sido motoristas de matérias perigosas apenas se enquadram nas
duas últimas categorias:
Sócio benemérito – “aqueles que por atos de ajuda, auxílio,
prestações ou doações feitas à Associação venham, como tal, a ser
reconhecidos”;
Sócio aliado – “aqueles que desenvolvem atividades de interesse ou
interligadas com os objetivos e fins da associação”.
Contudo, nos estatutos do sindicato publicados no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 41,
de 8 de novembro de 2018 (pp. 3925-3933), o n.º 2 do artigo 8.º fez desaparecer
essa categorização e indica que “podem fazer parte da associação sindical
[lembro que, contudo, a ANMMP tem outros estatutos e a composição dos seus
órgãos sociais é diferente, como atrás se descreveu] as pessoas singulares que:
a) Exerçam a atividade de motorista de matérias perigosas [que corresponde aos
sócios efetivos da ANMMP]; b) Tenham exercido a atividade de motorista de
matérias perigosas, e que pela prática de atos relevantes, contribuam para o
prestígio e desenvolvimento da associação [os sócios beneméritos da ANMMP]; c)
Desenvolvam atividades de interesse ou interligadas com os objetivos e fins da
associação sindical”, ou seja, designação que corresponde aos “sócios aliados”
da ANMMP, tendo desaparecido a especificação correspondente aos “sócios
beneméritos”.
É pois esta alínea c) do artigo 8.º dos estatutos do SNMMP (que na
redação se confunde muitas vezes com a ANMMP) que parece legitimar que um
empresário do ramo dos transportes e um advogado cujo escritório patrocina o
sindicato e que albergou nas suas instalações a sede social do próprio cliente,
sejam o Presidente e o Vice-presidente da direção daquela que não se sabe se é
uma associação sindical ou um sindicato (embora ambas as entidades tenham
existência própria e estatutos e corpos sociais diferentes, muito embora a promiscuidade
entre ambas seja por demais evidente e, no presente, partilhem as mesmas
instalações e contacto telefónico).
Todavia, tendo presente a redação do artigo 2.º dos estatutos da
ANMMP e o artigo 1.º dos estatutos do SNMMP, parece-nos que permitir aos sócios
não detentores da categoria de motoristas de matérias perigosas é uma faculdade
que excede a imperatividade do n.º
1 do artigo 440.º do Código do Trabalho.
Coloca-se, portanto a questão: Pedro Pardal Henriques é sócio e
dirigente da associação e do sindicato que o seu escritório patrocina (e onde
chegou a estar sediado o SNMMP). Não estarão ambas as funções em conflito, se
não legal (parece que a lei é omissa quanto a esse facto), pelo menos ético?
Onde está o limite das competências como sócio e vice-presidente do SNMMP e o
exercício simultâneo de funções como advogado contratado pelo mesmo sindicato?
Terá esta questão sido analisada por quem de direito (Ministério
do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, nos termos do artigo 447.º do Código
do Trabalho)?
E o que terá a Ordem dos Advogados a dizer deste comportamento? Caberá
o mesmo dentro dos cânones das rigorosas regras de deontologia profissional no
que se refere a incompatibilidades e impedimentos?
Imagem n.º 4
Entre as 21
áreas de atuação, o “direito do trabalho” aparece apenas na ótica de
apoio aos empresários (com especial enfoque no “comércio internacional e
exportações” e “insolvência e recuperação de empresas”) e não dos seus
empregados, destacando-se os recursos humanos no geral e o trabalho temporário,
com uma única referência à construção civil:
Imagem n.º 5
Quanto aos setores
de atividade, são apresentados dez preferenciais, mas entre eles não
se encontra o sindical nem tão pouco o dos transportes.
2 comentários:
Mais dois calões da burguesia do pcp de almada colocados na camara do seixal. Um deles a morar numa bruta vivenda. Seixal quartel dos elitistas e burgueses do pcp
Os boys do pcp que estavam a xular na camara de almada, foram todos pra moita e pro seixal e pra Loures. Xulos parasitas
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